Retomada econômica verde no enfrentamento à desigualdade

Com base no relatório A desigualdade Mata, lançado pela OXFAM, podemos perceber que a crise de saúde e a crise climática deságuam em um grande problema: a desigualdade social. Nesse sentido, cabe o questionamento: como minimizar os impactos das duas crises e garantir uma recuperação econômica que coloca as pessoas e a biodiversidade no centro do debate?

É isso que eu tento explorar nesse artigo. Não trago respostas prontas, mas convido você que está lendo a refletir sobre o papel da retomada econômica verde no enfrentamento à desigualdade. Vamos juntes?

Por Rayana Burgos

Com o início da propagação do COVID-19, vimos o cenário pandêmico alterando nossa rotina e tentamos acreditar que esse período incerto poderia desacelerar o ritmo caótico do planeta e colaborar com a recuperação da natureza. Aproveitamos esse suspiro otimista para defender a ideia de que a retomada da economia é uma oportunidade única para os governos criarem pacotes econômicos verdes que minimizem, simultaneamente, os efeitos da crise de saúde e da crise climática, garantindo a sobrevivência das pessoas e da biodiversidade.

Porém, na prática, a “recuperação ambiental” ainda não se tornou realidade. 

Como se caracterizaria uma retomada verde? É uma retomada econômica que aproveita oportunidades de investimento em setores estratégicos, promovendo novas tecnologias, inovações nos processos de produção e uso mais eficiente dos recursos públicos e privados, tirando as pessoas da pobreza e criando empregos. Além disso, também reduz a emissão de gases de efeito estufa, diminuindo a poluição do ar e resultando numa sociedade mais resiliente a surtos de doenças e aos impactos das mudanças climáticas.” 

Infraestrutura, florestas e usinas de energia eólica podem fazer parte de planos de recuperação econômica (foto: Divulgação/Abeeólica)

Esperávamos que uma pausa nas emissões ajudasse o planeta, mas não é isso que estamos vivenciando.

Mesmo com a desaceleração breve da economia, o número de emissões de gases de efeito estufa está aumentando rapidamente, numa tentativa de compensar o tempo em que as atividades foram paralisadas. E, segundo o Adaptation Gap Report 2021: The Gathering Storm, relatório do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), menos de um terço dos 66 países estudados havia financiado explicitamente medidas para conter o COVID-19 e os riscos climáticos, simultaneamente, em junho de 2021. 

Em linhas gerais, de acordo com o relatório, não associar a retomada econômica pós pandemia com o enfrentamento à crise climática é bastante prejudicial para os países no longo prazo. 

A diminuição das receitas do governo causada pela queda na economia, somado aos gastos para conter a crise sanitária pode dificultar os investimentos futuros em ações de adaptação, principalmente nos países em desenvolvimento. E o baixo investimento em ações de adaptação reduz a capacidade de resposta das cidades e das pessoas frente à crise climática, potencializando a vulnerabilidade das populações.

Nesse sentido, a retomada econômica verde carece também de ser justa e inclusiva.

A desigualdade social no mundo foi exposta durante a pandemia e potencializada por ela, no entanto, é esperado que a crise climática cause mais danos do que o COVID-19. Dessa forma, os investimentos para conter a crise climática não passam somente pela necessidade de garantir a sobrevivência da biodiversidade, como também precisa incorporar a luta pela justiça social com o olhar interseccional.

As questões de gênero, raça, classe e território são marcantes para definir o acesso da população aos recursos básicos necessários para enfrentar as diferentes crises, o que justifica as pessoas vivenciarem a crise climática e a pandemia de modo completamente diferentes. O relatório A Desigualdade Mata, da OXFAM, por exemplo, apontou que os dez homens mais ricos do mundo dobraram suas fortunas, enquanto mais de 160 milhões de pessoas foram empurradas para a pobreza entre 2020 e 2021. 

Esse dado reforça aquela ideia clichê, porém, cada vez mais real: nós não estamos no mesmo barco! O relatório ainda traz que, em uma estimativa conservadora, espera-se que 231.000 pessoas possam morrer a cada ano devido à mudança do clima em países pobres até 2030, por causa da baixa capacidade de se adaptarem e de se tornarem resistentes à mudança do clima.

Dessa forma, usar a recuperação fiscal da pandemia de COVID-19 para priorizar o crescimento econômico verde e inclusivo não somente ajuda as nações a se adaptarem aos eventos climáticos, como secas, tempestades e incêndios florestais, como também tem potencial de fortalecer a resiliência das pessoas diante dos impactos extremos. Se torna essencial colocar em prática o lema da agenda 2030 “não deixar ninguém para trás”, ao enfrentar a crise climática com a perspectiva humana.

Convidamos jovens da rede AJN para refletir sobre o relatório “A desigualdade Mata”, publicado recentemente pela @oxfambrasil, e que traz dados alarmantes sobre o aumento das desigualdades em nosso país nos últimos anos. Acesse o relatório aqui e leia o primeiro texto sobre a publicação,O poder de ditar quem vive ou quem morre’, escrito por Karen Rodrigues.

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