Renade divulga nota de repúdio à emenda aglutinativa da PEC 171/1993 e convoca movimentos sociais a continuarem na luta

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Da Redação

Na manhã desta quinta-feira, 2 de julho, a Rede Nacional de Defesa do Adolescente em Conflito com a Lei  (Renade) divulgou uma nota manifestando-se contra a emenda aglutinativa da PEC 171/1993, que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos. O texto destaca o autoritarismo e a inconstitucionalidade em colocar a proposta novamente em votação no dia seguinte após ter sido rejeitada em plenário, além de se apontar, com base em determinações das Nações Unidas, os equívocos que envolvem esta proposta, sobretudo por criminalizar a pobreza e a juventude sem, de fato, resolver o problema da desigualdade social e da violência.

Abaixo, disponibilizamos a íntegra da nota.

NOTA DA RENADE SOBRE A VOTAÇÃO EM PRIMEIRO TURNO DA EMENDA AGLUTINATIVA DA PEC 171/1993

A votação, em primeiro turno, da emenda aglutinava à PEC 171/1993 que tem como proposta de emenda constitucional alterar o artigo 228 da Constituição Federal para redefinir a idade para responsabilização juvenil para 16 anos nos casos de “violência ou grave ameaça, crimes hediondos, homicídio doloso, lesão corporal grave ou lesão seguida de morte” – representa, mais uma vez, os diversos retrocessos impetrados pelo Congresso Nacional.

Após a rejeição da Proposta de Redução da Idade Penal ocorrido no dia 30 de junho de 2015, o presidente da Câmara dos Deputados submeteu novamente a matéria a votação, de forma autoritária e inconstitucional, visto que a Constituição Federal de 1988 diz de maneira expressa que a matéria constante de proposta de emenda rejeitada ou havida por prejudicada não pode ser objeto de nova proposta na mesma sessão legislativa (Art. 60, parágrafo 5º).

O artigo 228 da CF que define a idade de 18 anos para responsabilização juvenil é uma garantia individual e não pode ser abolida mediante emenda constitucional (conforme define o artigo 60, parágrafo 4º da CF/88). A idade de 18 anos atualmente estabelecida como marco da maioridade penal, segue orientação da Convenção dos Direitos da Criança da ONU de 1989 e da Convenção Americana de Direitos Humanos.

Esse marco etário é uma garantia individual que pretende evitar a criminalização precoce e suas consequências e, por isso, tal proposta é uma afronta aos direitos de crianças e adolescentes no Brasil. Ao adotar medidas legislativas que evitam que essa parcela da população se tornem adultos com histórias de vida interessantes e inspiradoras, nos torna cúmplices de seu extermínio. Mas claro, a redução atingirá uma parcela da população que parece não incomodar a sociedade se morrer ou tiver seus direitos violados.

É urgente que continuemos a discutir discutamos amplamente os efeitos da aprovação desta PEC à juventude brasileira, sobretudo, adolescentes negros e pobres, que historicamente, foram e ainda têm seus direitos fundamentais negados. Pautemos a razão e não a emoção. Claro que pulsam histórias tristes de familiares que perderam seus entes, por meio de crimes hediondos, mas isso deve ser a potência para realizarmos mudanças que solucionem o problema da violência e não para trazer mais caos.

Para entender: A PEC aprovada pela Comissão Especial em 16 de junho de 2015, segue para duas votações no Plenário da Câmara. A primeira votação foi realizada no dia 30 de junho de 2015, com a proposta negada o presidente da Câmara Eduardo Cunha colocou novamente em votação no dia 1º de julho de 2015, 353 deputados votaram a favor da redução. A data do segundo turno da votação ainda não foi divulgada. Depois da Câmara, a votação seguirá para o Senado, casa na qual deverá ser aprovada também em duas votações, por 1/3 dos senadores. Não cabe veto presidencial desta proposta.

Criminalização da pobreza, aumento da mortalidade entre jovens negros e aumento dos índices de criminalidade e da violência no país: efeitos já conhecidos da ausência de uma política criminal adequada no Brasil. Os dados do anuário de segurança pública de 2014 pautam um dado importante: enquanto temos 20 mil adolescentes cumprindo medida socioeducativa no país, temos a 4ª maior população carcerária do mundo.  E o grande problema da segurança pública são os/as adolescentes?

O modelo de Sistema de Justiça Juvenil em vigência – definido pelo ECA –  já é um modelo duro, pois punimos dos 12 anos completos aos 18 anos incompletos.  Trata-se de um sistema diferenciado do adulto também porque há uma aposta na pessoa, na história de vida que pode ser reconstruída a partir de um ato infracional para que outros caminhos sejam possíveis. Não há desejo algum por mais violência na adoção desse Sistema – mais do que isso,  há aposta em direitos garantidos, na família, no Estado e na sociedade atuando de modo conjunto, para que o crime não se torne uma opção ao adolescente.

Outra proposta preocupante é o Projeto de Lei 333/2015, tramitando pelo Senado Federal. Esse projeto visa aumentar o tempo de cumprimento de medida socioeducativa de internação, entre outras alterações no ECA e no Código Penal, visando um grande retrocesso na esteira do que já preconizava o PL 7197/2002. São retrocessos, pois o Sistema em vigência não aposta na pena por puro exercício de vingança, por isso sua aplicação deve obedecer ao princípio da brevidade. O fator mobilizador do atual Sistema de Justiça Juvenil é o protagonismo juvenil e, por regra, trata o crime como excepcional na vida de um adolescente. Na teoria o etiquetamento do autor do fato considerado crime não é considerado como opção, mas não parece que o Congresso esteja a par da teoria que rege o ECA.

Apesar da grande mobilização da sociedade civil, das diversas notas técnicas produzidas por diversas entidades questionando a legalidade de tais iniciativas legislativas e notas diplomáticas alertando o Congresso Nacional da grave violação de Direitos Humanos, eles seguem adiante, infringindo a própria Constituição.

A Renade – Rede Nacional de Defesa do Adolescente em Conflito com a Lei conclama a todas as organizações e movimentos sociais a continuarem na luta pela garantia dos direitos de crianças e adolescentes e contra a redução da maioridade penal.

Jornalista, professor e educomunicador. Responsável pelos conteúdos da Agência Jovem de Notícias e Revista Viração.

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