Racismo reverso e heterofobia existem na sociedade?
Por Bianca Muniz e Caroline Aragaki, da Jornalismo Júnior (ECA-USP)
Imagem: midianinja on Visualhunt.com / CC BY-NC-SA
As populações negra e LGBT têm cada vez mais reivindicado o seu espaço dentro de uma sociedade eurocêntrica e heteronormativa, trazendo as pautas do racismo e da LGBTfobia à tona. Entretanto, como tais tipos de discriminação contra minorias afetam fortemente as relações sociais, questiona-se se é possível que a opressão ocorra pela via contrária, ou seja, que brancos e heterossexuais sofram preconceitos como um racismo reverso ou heterofobia, devido às suas características.
Em seu livro “O que é lugar de fala?”, a filósofa Djamila Ribeiro, citando a pesquisadora Luiza Bairros, comenta que o lugar social ocupado por uma pessoa é responsável por diferentes perspectivas diante de um mesmo tipo de acontecimento. Nesse sentido, sofrimentos que podem afetar uma pessoa branca devido ao seu tom de pele não possuem o mesmo significado que a opressão sentida pela população negra, que carrega consigo as marcas do período escravocrata.
Trata-se de uma falsa simetria: comparar a opressão com o sofrimento de nível particular é injusto, visto que “a opressão é uma máquina muito bem constituída para atingir mais de um indivíduo, sendo algo pensado; ela nasce de discursos, que constituem as formas mais corriqueiras da vida social e cultural”, conceitua Emerson Inácio, professor de Estudos Comparados da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH-USP) que se dedica a abordar Teoria Queer, Gênero, Sexualidades e Diversidade Sexual.
Ainda para ele, racismo é um mecanismo opressivo “articulado em termos de condição na medida em que a sociedade se estabelece e se baseia no racismo, muitas vezes, para fazer manutenção de determinados lugares”. Este coisifica, apresentando uma condição material muito baseada na percepção do outro como algo menor do que é considerado padrão.
Em nossa sociedade, somos educados para trabalhar com determinadas figuras como universais quando, na verdade, eles só são reflexo daqueles que, tendo poder, podem declarar aquilo que é padrão e aquilo que não é padrão. Para Inácio, “branco e heterossexual não é um padrão em si, mas acabou se constituindo como tal, porque era quem dominava as regras dos discursos” assim, criaram, para si, um lugar especial em que aquele que não é branco e heterossexual acaba sendo denominado como diferente e de forma pejorativa.
Seria possível imaginar a existência da heterofobia se a heterossexualidade fosse um desvio do que é considerado padrão na sociedade. Do mesmo modo, o racismo reverso seria explicado se brancos tivessem sofrido com a escravidão e com as heranças desse momento por séculos depois, como piores condições de trabalho e menor presença nas instituições de ensino superior. Mas essa não é a realidade. “Não há questões histórico-econômicas capazes de justificar um ódio a quem seja hétero ou a quem seja branco”, afirma Inácio. Essas pessoas não carregam características sociais, afetivas e raciais que vão representar estigma. Por outro lado, “homofobia, racismo e todas as demais formas de opressão estão baseadas em enfatizar elementos que estigmatizam, ou seja, que marquem”, completa.