Racismo: o engajamento no todo e o engajamento no nada
Se o racismo não é aquilo distante, mas esses pequenos atos que perpetuamos em nosso cotidiano, precisaremos romper com essa radicalidade que é visada nos engajamentos coletivos e começar a sustentar práticas e ações que promovam a aproximação entre as lutas antirracista e os sujeitos, como diz o Emicida: “hei, olhe ao seu redor, camarada”.
Por Reynaldo de Azevedo Gosmão
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Quem se engaja no todo faz o mesmo movimento de quem se engaja no nada
Atualmente, muitos sujeitos são engajados nas redes sociais; todos tem um lado, mas que lado é esse? Com o movimento Vidas Negras Importam (Black Lives Matter), foi possível observar, que quase todas as pessoas que conheço subiram uma hashtag a favor do movimento, ou postou no feed do Instagram uma foto preta com a hashtag #blackouttuesday.
Mas o que ficou em nossas vidas após a aderência desse movimento ou quais as mudanças pontuais que fizemos na cultura brasileira? Escutando a música Bang do Emicida me veio algumas reflexões que nos ajudará pensar a cerca do tema. A primeira: “Quem é quem nessa multidão?” e no decorrer da música já encontramos a resposta: “nem todo mundo que ‘tá é, nem todo mundo que é ‘tá”.
Deixo claro que minha crítica não é ao movimento Vidas Negras Importam, que mantém grande importância para a pauta do racismo, mas meu foco será pensar o que temos tomado de forma efetiva para a nossa realidade, para além do “abraço que de ontem pra hoje ser preto ficou legal”.
Tenho me questionado se os engajamentos nas redes sociais não tem sido uma forma de se isentar das responsabilidades que precisamos assumir dentro da nossa cultura, o engajamento nas redes sociais se tornou uma bandeira e/ou fachadas de uma luta totalizante, ou seja, “eu sou antirracista nas redes sociais, então sou antirracista na vida”.
O que pode ser aprendido é que ao invés de engajar em pequenas ações no cotidiano, nos engajamos em algo maior, tendo como exemplo: ao contrário de pensar nossas atitudes racistas, subimos hashtag como forma de validação “eu sou antirracista”.
Penso que a aderência em ações macros é uma justificativa para uma não ação micro, que permeia nossas vidas em diversas frentes, seja na escrita de um trabalho acadêmico: “preciso escrever meu TCC, mas como é muita coisa, prefiro me queixar ao contrário de rascunhar uma folha por dia”, ou os famosos três quilos que se deseja perder: “como três quilos são muita coisa, prefiro continuar com a mesma dieta, mesma rotina, sem ter que ter trabalho”.
Não é uma disputa entre ações maiores e menores, mas precisa haver um diálogo entre as ações macros e micros, se ficarmos apenas nas lutas por redes sociais o todo se torna uma luta esvaziada.
Se avaliarmos de forma mais efetiva, qual o impacto das ações antirracistas a nível micro: quais ações que nos engajamos nas redes sociais e que os nossos familiares terão acesso? E os meus vizinhos? Qual a vida útil dos engajamentos que fazemos nas redes sociais dentro das nossas comunidades?
O engajamento para a democracia, para a luta antirracista, pautada na diversidade, promove a circulação do dizer, e talvez, algumas propostas vão além de subir hashtags, que começamos a seguir mais pessoas pretas nas redes sociais, escutar mais Emicida, Racionais, Karol com K, Beyonce, além de postagens nas redes sociais, promover encontros virtuais com os familiares sobre a temática antirracista, consumir produtos culturais feitas por pessoas pretas, inclusive nos questionar porque nos relacionamos as vezes mais afetivamente e sexualmente com pessoas brancas do que pretas.
Se o racismo não é aquilo distante, mas esses pequenos atos que perpetuamos em nosso cotidiano, precisaremos romper com essa radicalidade que é visada nos engajamentos coletivos e começar a sustentar práticas e ações que promovam a aproximação entre as lutas antirracista e os sujeitos, como diz o Emicida: “hei, olhe ao seu redor, camarada”.

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