Racismo futebol clube

Conhecido popularmente por unir povos e culturas sem distinção de crença, raça ou país de origem, o futebol tornou-se vitrine da realidade social com as últimas demonstrações de casos de racismo e falta de ações que cumpram com os protocolos em casos de ataques durante as partidas.

Por Thaynara Floriano

O Brasil é um país moldado na colonização ena escravidão. Quando o futebol chegou por aqui, por volta de 1894, trazido pelo paulista Charles Miller, um brasileiro filho de ingleses que trouxe da Inglaterra duas bolas e um manual com as regras do esporte, passou a ensiná-las para os brasileiros.

Essa é a narrativa contada nos livros de história do Brasil. Mas vale ressaltar que existem outras versões. Há rumores de que as peladas realizadas por aqui já ocorriam desde 1875, quase 20 anos antes de Miller levar o mérito. Essas são informações populares, mas menos reconhecidas, devido à escassez de registros oficiais e pelo racismo que, como forma de controle elitista, excluiu muitos documentos e registros históricos de realizações negras. Charles pertencia a elite paulista, seu pai foi o fundador do clube de elite São Paulo Athletic Club e o único material que se tem documentado sobre essa história são notícias de jornal guardadas como documento, originando o mito de que ele foi o precursor do futebol no país.

Somente a elite branca participava de jogos oficiais, mas o esporte não demorou para chegar nos trabalhadores negros e periféricos, e a várzea passou a ser um momento de lazer na realidade dos brasileiros. A inserção de atletas negros no futebol profissional não foi consequência de uma luta antirracista – o processo estava ligado a questão do capital: os atletas negros também eram habilidosos, muitas vezes mais que os da elite branca, e os clubes passaram a desejá-los com interesse no dinheiro que as vitórias e os títulos traziam – tanto que os atletas negros entravam e saiam pela porta dos fundos dos clubes e não tinham o mesmo prestigio e respeito que os brancos. 

Anos mais tarde, o futebol foi completamente dominado pela excelência negra de Pelé, que não só é o melhor jogador de futebol de todos os tempos, mas era também um homem preto e retinto. Além do Rei Pelé, o Brasil gerou muitos outros talentos de pele preta, Ronaldinho Gaúcho, Rivaldo, Leônidas da Silva, Barbosa, Garrincha, Didi, Jairzinho, Romário, Neymar, Vinicius Jr, entre outros tantos. O talento do povo preto não é uma exceção no futebol, e cada vez mais é nítido que o que falta para pessoas negras é oportunidade de demonstrar a excelência com aquilo que se comprometem. O que nos falta é oportunidade de demonstrar nossas habilidades e o valor da nossa história.

Vinicius Jr é um talentoso jogador que, mesmo com 22 anos, já conquistou campeonatos como a Champions League, SuperCopa da Espanha e o Mundial de Clubes, além de ter sido eleito o melhor jogador do Mundial de 2022 e do clube Real Madrid na temporada 2022-23. E mesmo todo esse prestígio não impede que olhares de preconceito estejam sempre acompanhando seus chutes a gol.

Nos últimos meses, temos acompanhado ofensas racistas ao jogador vindo de vários torcedores adversários, xingamentos como mono (macaco) ecoaram por minutos durante a partida do Real Madrid contra o Valencia, em maio deste ano. Os casos de racismo recorrentes sofridos por Vini Junior levantaram protestos em redes sociais e críticas à direção da LaLiga, responsável pelo campeonato espanhol. O atacante brasileiro rebateu o presidente da entidade, que tratou o caso como algo normal, fazendo com que o mesmo voltasse atrás e se desculpasse.

O caso de Vini Jr. não é isolado. Só em 2021, de acordo com o Observatório da Discriminação Racial no Futebol, houve 158 casos de racismo no futebol brasileiro. O número bateu recorde no levantamento, que é feito anualmente desde 2014. Em 2019, também foram 158 ocorrências, iguais aos números do ano passado.

É fundamental uma integração internacional entre a CBF, as ligas de outros países e intersetorial, reunindo instituições como o Ministério da Igualdade Racial no Brasil e seus equivalentes pelo mundo, o setor privado, pois os clubes atendem cada vez mais à lógica capitalista, e a sociedade civil para garantir soluções efetivas que garantam o direito de atletas negros existirem e exercerem sua profissão sem ataques e ameaças racistas.

O racismo não é uma doença, é uma construção social apoiada no sistema capitalista, que usa da marginalização dos corpos negros para lucrar e fazer a manutenção de um sistema excludente e completamento dominado pela elite branca. Já passou da hora de romper com essa lógica, na vida e no futebol.

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