Mais de 100 milhões de pessoas, incluindo crianças e idosos, vivem em situação de deslocamento forçado no mundo inteiro. Foto: Ahmed akacha/Pexels

Quanto custa a ajuda humanitária? 

O que países como Israel e Ucrânia têm para conseguirem monopolizar a atenção e os esforços do resto do mundo quando o assunto é a crise dos refugiados? Interesses individuais e econômicos ainda se sobrepõem ao sentimento de coletividade e ao olhar humanitário. A garantia de direitos fundamentais deveria ser prioridade, já que se trata de algo tão básico. É justo que a ajuda humanitária dependa da parte financeira?

Por Sofia Leite

Desde o começo deste mês, um conflito bélico entre Israel e o grupo terrorista Hamas, atuante na Palestina, vem chocando pessoas de todo o mundo. Com o avanço da guerra, governos de diversos países se disponibilizaram para prestar ajuda humanitária às vítimas (quase sempre, apenas as do lado de Israel) e retirá-las do fogo cruzado. A ideia de receber refugiados, abominada em muitos lugares, passou a ser tratada como um imperativo. No entanto, esse problema humanitário existe, há muito tempo, em outras partes do globo – naquelas que, infelizmente, não são apoiadas pelo imperialismo estadunidense. 

Muito se fala sobre a globalização e os benefícios que ela trouxe para a humanidade, diminuindo distâncias e facilitando as trocas entre os países. Mas se é assim, por que os empecilhos para o deslocamento de pessoas entre as nações, em vez de diminuírem, como aconteceu com as mercadorias, só aumentam? O ex-presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, teve como uma de suas promessas de campanha, em 2016, a construção de um muro barrando a entrada de imigrantes mexicanos no território controlado por ele. Essa lógica individualista e preconceituosa influencia as decisões de diversos Estados considerados desenvolvidos desde que o mundo é mundo.

Segundo a Agência da Organização das Nações Unidas para Refugiados, em maio de 2022, mais de 100 milhões de pessoas estavam em situação de deslocamento forçado no mundo inteiro, fugindo de conflitos, violência, violações dos direitos humanos e/ou perseguições relacionadas a questões de raça, religião, nacionalidade, opinião política ou pertencimento a um determinado grupo social. Ainda conforme a Organização das Nações Unidas (ONU), a Turquia abriga a maior população de refugiados do globo. Líbano e Jordânia, enquanto isso, estão entre os países com a maior quantidade de pessoas nessa condição per capita. Parece que a preocupação das nações “desenvolvidas” com essa crise mundial só existe quando surgem problemas que afetam aliados dos Estados Unidos ou regiões da Europa.

Em 2020, o Reino Unido saiu da União Europeia, em um movimento que ficou conhecido como Brexit – abreviação de British exit, ou seja, saída britânica. Um dos principais motivos para a realização desse processo foi a questão dos refugiados. A maior parte da população britânica considera que a entrada de pessoas em deslocamento forçado no território representa uma ameaça, o que vai de encontro às políticas acordadas dentro da União Europeia. Na época, as preocupações relatadas eram o aumento dos gastos públicos, a superlotação dos sistemas de educação e saúde e a diminuição de empregos e moradias para a população local.

Com os países mais bem estruturados abrindo suas fronteiras apenas para receber mercadorias, nunca pessoas, o peso fica todo nas costas dos menos preparados. No Líbano, país que recebe muitos refugiados, mais de 90% dos sírios deslocados, por exemplo, vivem em situação de extrema pobreza, como aponta a ONU.

Qual é a razão para que os esforços do “primeiro mundo” sejam maiores com refugiados do conflito entre Ucrânia e Rússia ou da guerra entre Israel e Hamas?

Países como Somália, Nigéria e Iêmen vivem condições desoladoras, que obrigam a população a deixar sua terra natal e procurar uma nova casa. A união entre aumento populacional e diminuição da fertilidade do solo vem gerando conflitos nessas localidades por conta da falta de recursos naturais e forçando as pessoas a fugirem. É inadmissível que algo tão básico como comida seja negado pelos que têm muito aos que não têm nada.

A Somália enfrenta a pior seca das últimas quatro décadas, o que vem acabando com o gado e as plantações. Mais da metade da população do país, devido a isso, precisa de assistência humanitária. A quantidade de pessoas deslocadas por conta da estiagem ou dos conflitos atingiu um recorde e, grande parte dela, é formada por mulheres e crianças.

Já a Nigéria, vive, atualmente, em estado de emergência devido ao aumento dos preços dos alimentos. A escassez desses produtos é uma realidade nas casas das famílias do país. Em janeiro, a ONU afirmou que mais de 25 milhões de nigerianos estavam em alto risco de insegurança alimentar. Essas questões geram conflitos e deslocamento forçado.

A Agência da ONU para Refugiados também aponta que o Iêmen passa por uma das piores crises humanitárias do mundo. Desde 2015, milhões de pessoas são forçadas a deixar suas casas para escapar de conflitos. Nessas circunstâncias, muitos não têm outra opção além de buscar segurança, abrigo e ajuda de emergência em outros países.

Enquanto a questão dos refugiados não for tratada como um problema humanitário mundial, ou seja, que é responsabilidade de todos, a justiça social não será alcançada. O direito à nacionalidade deve ser garantido a todos. No fim, o individualismo, o preconceito e a busca por lucro acima de tudo não levam a lugar nenhum. Em tempos de crise, os sábios constroem pontes e os idiotas constroem muros.

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