Em 2022, o país ganhou mais de dois milhões de novos eleitores entre 16 e 18 anos – Victor Freine – Levante Popular da Juventude. Reprodução Brasil de Fato

Participação política e social: histórias para inspirar

Conheça a história de 3 jovens que estão fazendo a sua parte para um futuro sustentável lutando por causas importantes e que demonstram a potência da juventude organizada.

Por Natalie Hornos, analista de projetos da Viração Educomunicação, especial para o Guia de Advocacy do U-Report Brasil

O que te vem à mente com esse termo: Participação política? Pense alguns minutinhos sobre isso.

Existem diversas formas de participar da sociedade: escolher criticamente em quais candidatos e candidatas votar nas eleições, fazer parte da associação de bairro, acompanhar as atividades da Câmara Municipal e da Prefeitura da sua cidade, se juntar a uma organização do terceiro setor, conhecer as discussões propostas pelo sindicato da sua categoria profissional ou fazer parte de algum movimento social em defesa das pautas que você considera importantes são algumas delas.

A participação política e social é a melhor forma de atuar e cocriar soluções para tornar nossa sociedade melhor e mais justa. É por isso que várias pessoas, coletivos, ongs, e outros trabalham para defender que adolescentes e jovens tenham espaço para opinar na vida pública, que possam encontrar espaços de participação social, pautando suas demandas e escolhas, principalmente quando começamos a perceber a importância da participação social desde a adolescência. 

Quando a juventude se organiza, existe um potencial imenso de mudança. Você se lembra?

Entre 2015 e 2016, jovens estudantes de São Paulo se mobilizaram e ocuparam suas escolas para dizer não a projetos de reorganização escolar, que aumentariam as desigualdades no ensino público. Indignados com a falta de consulta, deram um show de organização popular e fizeram história! As ocupações se espalharam pelo país e, em diversos estados, projetos parecidos foram derrubados. Em São Paulo, os secundaristas conseguiram pressionar o governo pela troca do secretário de educação.

Conheça mais sobre a primavera secundarista em 3 filmes:

  1. ACABOU A PAZ, Isto aqui vai virar o Chile! Escolas Ocupadas em SP – de Carlos Pronzato
  1. Diários da Ocupação – A Luta dos Secundaristas
  1. Primavera Secundarista (Documentário)

Para apoiar a reflexão sobre estas diferentes formas de garantir nossas vozes, conversei com 3 jovens de diferentes regiões que têm trajetórias diversas com múltiplas formas de atuação política. São jovens que se dedicam a construir uma democracia mais forte, na qual a juventude é ouvida e contribui ativamente para uma sociedade menos desigual e mais justa.

Daniel Sobczak de Souza, 24 anos – Ariquemes, Rondônia

Coordenação Nacional do Coletivo de Juventude do MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores.

Daniel Sobczak de Souza. Acervo pessoal

Daniel conta que nasceu “na ciranda do movimento”.  Nascido em Rondônia, é filho de um casal de camponeses que já atuavam em sindicatos rurais desde 1996. O jovem camponês lutou, junto com sua família, pela conquista de um assentamento de reforma agrária por volta dos 15 anos, pois, na época, os agricultores estavam sendo expulsos de suas terras em um fenômeno conhecido como êxodo rural. Junto com membros das comunidades vizinhas, ajudou a construir o Movimento dos Pequenos Agricultores. Foi assim que, desde cedo, Daniel se dedicou a lutar por melhores condições da sua realidade camponesa.  Produção de alimentos saudáveis, sem veneno, além da distribuição justa de terras para camponeses, abastecimento popular para evitar a fome, o cuidado das sementes para manter a diversidade, soberania alimentar, que é o direito que tem as pessoas a comer – e comer bem – e a produzir os próprios alimentos.

P: O que faz o coletivo jovem do MPA? 

O movimento social não é um trabalho. Ele representa a classe trabalhadora. É uma opção de vida, e é importante para a construção de poder poupar, para que a classe trabalhadora tenha acesso aos direitos que são garantidos, mas não necessariamente ofertados. Todos os direitos que temos hoje no mundo, foram graças à luta dos movimentos sociais. Imagina que antes os trabalhadores não tinham limite de carga de trabalho, ou carteira assinada.  Graças a luta do povo organizado, isso foi conquistado. Mas está em permanente disputa. Toda hora vem alguma proposta do congresso, tentando diminuir esses direitos já conquistados. Por isso que o coletivo de jovens do MPA luta para que possamos acessar políticas públicas. O MPA construiu o plano camponês, que luta para que quem mora no campo possa permanecer lá, mas acessando esporte, lazer, cultura, educação, saúde, moradia, tecnologia e inclusive energia, conectividade e, claro, terra. Defende as sementes crioulas, o bom cuidado com os animais, e a preservação de saberes e conhecimento dos povos que vêm passando de geração a geração. Também busca melhorar condições, créditos, possibilidade de produzir e vender o que plantamos, com tecnologia para não ser penoso, mas preservando o meio ambiente. E dentro do coletivo de jovens do movimento, pautamos a ́Nova geração Camponesa ́- as brigadas permanentes das juventudes, onde a gente se reúne para estudar, ou criar dinâmicas e ações específicas, além de caravanas onde juntamos jovens para trabalhar a agroecologia nas comunidades, escolas, e outros. A gente coloca nossa força no movimento Nossa geração está numa linha tênue – ou muda o modelo de produção, ou a gente vai sofrer impacto pelo avanço das crises climáticas. 

P: Quais são os maiores desafios enfrentados pelos jovens camponeses?

Hoje nossa maior ameaça é o agronegócio, que envenena nossos alimentos. Existem muitas comunidades cercadas, com solos e terras contaminadas. Além disso, outro desafio é êxodo rural é um dos grandes problemas. Por falta de acesso a direitos básicos, são empurrados para as cidades, onde encontram opções de trabalho, educação e lazer. Mas, não é isso que desejam estes jovens. Na contramão dessa super urbanização, que gera superlotação das cidades, desigualdade urbana e tantas outras dificuldades, estes jovens lutam para que possam permanecer no campo. Para que campesinato não seja sinônimo de desigualdade, mas de dignidade pela vida em harmonia com a natureza, com a produção do próprio alimento, em uma dinâmica comunitária e coletiva. Precisamos melhorar a moradia, superar o trabalho penoso, e garantir dignidade.

O que é um assentamento de reforma agrária?

O assentamento de reforma agrária é um conjunto de unidades agrícolas (parcelas ou lotes) instaladas em um imóvel rural. Podem ser criados por meio de obtenção de terras via Incra, assim como, implantados por instituições governamentais que após o seu reconhecimento passam a ter acesso às políticas públicas.

O que é o Movimento de Pequenos Agricultores?

O Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA é um  movimento camponês, de caráter nacional e popular, de massas, autônomo, de luta permanente, cuja base social é organizada em grupos de famílias nas comunidades camponesas. O MPA busca resgatar a identidade e a cultura camponesa, na sua diversidade, e se coloca ao lado de outros movimentos populares do campo e da cidade  para   a construção de um projeto popular para o Brasil baseado na soberania e  pelos valores de uma sociedade justa e fraterna. A organização do MPA significa que os camponeses têm necessidades comuns que são maiores que seus  limites territoriais. Por isso vimos a necessidade de   construir uma nova forma de organização política, capaz de unificar esses processos de luta  e desenvolver-se numa perspectiva nacional. Atualmente o MPA está organizado em 17 estados brasileiros em todas as regiões do país,  e após 22 anos  de existência apresenta expressivo histórico de luta e organização do campesinato brasileiro organizando  aproximadamente 100 mil famílias camponesas de forma direta  em todo o território nacional. Fazemos  parte da Via Campesina Brasil e Via Campesina Internacional, da Confederação Latino-americana de Organizações Camponesas – CLOC, e da Frente Brasil Popular. – https://mpabrasil.org.br/

O que é o êxodo rural no Brasil?

O processo de êxodo rural foi bastante intenso no Brasil, especialmente ao longo da segunda metade do século XX, em razão do crescimento do fenômeno de industrialização do país, que, por consequência, fomentou a urbanização do território brasileiro. Ademais, as questões rurais, como a modernização das atividades agropecuárias e a concentração fundiária das propriedades, também foram fundamentais para a expansão do processo de êxodo rural no Brasil. Nesse contexto, o Brasil tornou-se oficialmente um país urbanizado em 1970, principalmente por causa do crescimento acelerado das cidades em razão do fluxo de população proveniente das áreas rurais. Esse processo de urbanização aconteceu de forma intensa e acelerada no Brasil, que, mediante a ausência de políticas de planejamento urbano, gerou inúmeros problemas ambientais e sociais. Atualmente, o fenômeno de êxodo rural ainda acontece no país, mas de forma bem menos acelerada que no século anterior.

Jane Moura, 24 anos – assistente de projeto do Instituto Mapinguari

Jane Moura. Acervo pessoal.

A jovem se formou em Ciências Naturais pela UEAP. Mora na zona norte de Macapá, no bairro Brasil Novo, e é “aprendiz ativista no mundo politico”. Se identificou como indivíduo político quando entrou na universidade. Lá, participou pela primeira vez de atividades que considera políticas: mobilizações para a limpeza do rio Amazonas, com o aprofundamento nos estudos dos corais da Amazônia. Atualmente, para ela, as principais lutas das juventudes da região são por transporte público, educação e proteção ambiental.

P: Conte sobre o seu trabalho, sua atuação política no instituto e o contexto regional que estão inseridos: 

Amapá é um lugar bonito, somos abençoados com o rio amazonas. Cheio de lugares naturais, bons para se visitar, muitos lugares preservados, natureza, lugares para conhecer. Nosso estado é muito diverso. Tem jovens do setor urbano, rurais, quilombolas, indígenas, ribeirinhos. O que falta são políticas para jovens. Que garantam espaços para que possam se expressar e também se divertir. Não tem tanta oferta política, de lazer, social. Acho que isso ameaça que a voz do jovem seja calada. 

O trabalho que atualmente realizo na organização, me ajuda a manter um pé aqui.  A existência dessa ong possibilitou que atuasse com mais amor, que está se desenvolvendo, conhecendo outras formas de relações profissionais. Nunca é tarde para se conhecer e se redescobrir. Podem mudar de ideia. Conhecer coisas novas. Se arrisquem, esse é o momento!

O que é o Instituto Mapinguari?

O Instituto Mapinguari (IMAPIN) é uma Organização Não Governamental da Amazônia que atua desde 2015 apoiando e executando ações de defesa, preservação e conservação do meio ambiente, bem como incentivando a promoção do desenvolvimento sustentável da Região. Desde sua fundação, o Instituto busca a consolidação e fortalecimento de Áreas Protegidas, especialmente do Estado do Amapá. Tal estratégia busca a valorização do capital ambiental, cultural e socioeconômico das áreas protegidas e seus habitantes. Reconhecendo o papel fundamental das comunidades tradicionais na proteção da biodiversidade e seus territórios, o Instituto tem buscado fortalecer cada vez mais as pessoas que estão na linha de frente da proteção ambiental e na luta pela justiça social e climática.

Hannah, 27 anos – mulher afro indígena, Diretora Executiva do Mapinguari. Ativista, artista, arteira

Hannah. Acervo pessoal

Cabocla da Amazônia nascida no Pará e criada no Amapá, a jovem é bacharel em Biologia pela UNIFAP, e ligada ao ativismo ambiental desde a universidade. Ponto focal do Mapinguari na  ReLLAC-j e educadora popular ativando o debate climático em comunidades tradicionais e cidades da Amazônia. Atualmente, sua principal luta é pela defesa do meio ambiente, por meio da promoção da agroecologia, transição energética e desenvolvimento sustentável para o estado Amapá, e luta contra o racismo ambiental. Participou do evento Amazônia Terra Preta – evento para falar sobre justiça climática e racismo ambiental. Participou ativamente de campanhas contra a exploração de petróleo na foz do Amazonas. Se reconheceu politicamente pela primeira vez dentro da universidade. Conta que tiveram conquistas importantes, como a conquista de uma cadeira no conselho:

“Hoje vemos muitos jovens e famílias se deslocando para outros estados. O amapá também tem a polícia que mais mata no Brasil, e nós sabemos quem são esses corpos: periféricos, negros e jovens. As maiores ofertas de concurso público são para polícia militar. Mas, mesmo com esse contexto, vamos construindo nosso caminho de lutar por melhorias. Um dia não existia conselho nacional da juventude, hoje existe. Por isso insisto que nunca é cedo para fazer algo. Para começar. Por mais jovem que seja.  Nunca é cedo demais para se indignar. Tem jovem barrando pedalada climática sendo muito novo. A gente não pode ter medo de errar.  Não saber é o primeiro passo para saber.  Se não aceitarem, criem outro novo jeito”

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