#Opinião: Sobre o luto do sentir

Por que é tão difícil para nós lidarmos e darmos vazão aos nossos sentimentos? Por que é exigido de nós que criemos barreiras para não deixar transparecer emoções? Esse texto traz minhas reflexões sobre o que chamo de luto do sentir.

Por Mariana Gomes

Que as pessoas, de modo geral, não conseguem ou não sabem lidar com a própria tristeza ou com a tristeza do outro, não é novidade pra ninguém. Mas, mais do que sobre a tristeza, esse texto é sobre sentir e sobre ter a “permissão” para sentir. 

Recentemente passei por uma situação delicada e estou vivenciando – de um jeito meio torto, confesso – um processo de luto completamente inesperado, que afetou não só a mim enquanto pessoa, mas também enquanto profissional. E o que eu mais percebi foi que, de todas as pessoas com quem conversei – ou tentei – sobre o ocorrido, de todas as pessoas que me perceberam diferente ou me viram chorar, apenas duas me permitiram sentir. 

E, veja bem, não é que eu, você ou qualquer outra pessoa precise, de fato, de permissão para sentir ou externar o que quer que seja. A questão é, no entanto, ter espaço – tanto física quanto emocional e psicologicamente – para o sentir, no apoio que esperamos ver e receber no e dos outros.

De todas as tentativas que fizeram para não lidar com a minha tristeza, as frases que ouvi mais frequentemente foram: “Não precisa chorar”, “não precisa ficar assim”, “pelo menos você fez o que podia”, seguidas, claro, de uma mudança brusca de assunto, quando tudo o que eu queria e de que eu precisava era poder sentir, ter a liberdade de colocar pra fora o que me corroía, aliviar o peso do coração, da mente e do estômago. É claro que eu  entendo a boa intenção de todas essas pessoas, sei que queriam o meu bem e apenas não sabiam o que fazer ou como agir. E é exatamente esse o ponto.

Porque é tão difícil lidar com o sentir do outro – e, às vezes, até com o nosso?

Em especial quando esse sentir vem carregado de intensidade, sejam sentimentos e processos “ruins”, como o luto, a tristeza, a raiva, a irritação, o estresse e o cansaço, mas até mesmo os bons, como a felicidade e a euforia. Me pego pensando em quantas vezes quis disfarçar o meu estresse, a minha tristeza e até a minha felicidade por medo de incomodar quem estivesse ao meu redor. O ponto é que eu escondia esses sentimentos até de mim mesma e, claro, isso não me fez bem, me tornei uma pessoa fechada, com medo e dificuldade de se expressar e até sem coragem para existir enquanto protagonista da minha própria vida. 

Esse texto, infelizmente, não vem com uma lição. Também não tenho respostas concretas para as perguntas que fiz. Tenho apenas um apelo, um pedido, talvez um desejo: se permita sentir. Se permita entristecer, sofrer, chorar ou rir, se alegrar, explodir de felicidade e deixar escapar a euforia. A vida já é difícil demais para contermos os sentimentos.

Acredito, genuinamente, que quando conseguirmos nos permitir passar pelos sentimentos reconhecendo o que eles têm a oferecer, se tornará mais fácil acolher, olhar e reconhecer o outro.

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