O quarto poder e a sociedade hiperinformada
Como o avanço da tecnologia possibilitou a sociedade a contestar o discurso da grande mídia, dando voz a temas menosprezados
Por Cristina Lins
O Seminário Jornalismo, as novas configurações do quarto poder, realizado pelo Sesc Vila Mariana e a Revista Cult, que acontece entre os dias 14 e 16 de agosto, discutiu no primeiro dia questões como a sociedade hiperinformada, hiperconectada e o poder da imprensa independente de dar voz aos temas que não são abordados na mídia tradicional, a parcialidade da mídia e seu perigo para democracia.
“Imparcialidade nunca foi um requisito do jornalismo, o jornalismo foi criado para ser parcial e caminhar junto com a democracia, não pode ser imparcial quando a democracia é ameaçada”, defendeu o professor da Universidade Federal da Bahia, Wilson Gomes durante uma das mesas de debate. A repórter especial da Agência Pública, Andrea Dip, contou que ao escrever uma matéria o objetivo do jornalista não deve ser o de confirmar uma tese, mas qualificar o debate, enriquecê-lo, não converter seu leitor.
O jornalista e escritor Xico Sá falou sobre o perigo da grande imprensa apresentar uma verdade parcial como verdade absoluta, e que o quarto poder é tão perigoso como as fake news. Para ele, a padronização no jornalismo brasileiro é latente e o uso constante das mesmas fontes não dão ao jornalismo a pluralidade que deveria ter. “Dá para ser plural, e isso se perdeu no jornal. Eu me queixo do desequilíbrio”, lamenta.
Maria Rita Kehl criticou a tendência das “bolhas” nas redes sociais. Para ela, numa democracia precisamos nos aliar a pessoas diferentes, com opiniões diversas. A psicanalista e escritora falou ainda sobre a cobertura jornalística no país: “há escolhas sobre o que se noticia; há assuntos que somem e outros assuntos que são perseguidos pela mídia”, comenta exemplificando com a ausência de notícias sobre a denúncia de que a reforma do apartamento da filha do presidente Michel Temer, teria sido paga com dinheiro de propina.
Xico Sá também criticou a cobertura parcial da mídia e reforçou a importância de o jornalismo dar voz aos diversos vieses da notícia. “Nunca foi tão pequeno o apetite de buscar a outra versão no Brasil”, complementou.
A contestação ao discurso produzido pelos principais meios de comunicação se dá muitas vezes pela imprensa independente, pela resposta do leitor. As redes sociais permitem que essa resposta se dê em um tempo muito rápido, se comparado há alguns anos atrás, em que o leitor precisava enviar cartas às redações.
O discurso partidarizado de diversos veículos de imprensa, que são liderados por poucas famílias, formando oligopólios na formação da opinião pública, estão saindo do papel com a crise do jornalismo e ganhando espaço no virtual. Em contrapartida, nos debates do seminário, foi ressaltado em diversos momentos que a facilidade de acesso à internet e smartphones trouxe uma nova vertente na cobertura dos fatos, inclusive manifestações públicas, como em 2013, contrariando a versão dos grandes jornais. “É preciso que a sociedade veja isso como um mecanismo de democracia” pontuou Andrea Dip.