“O Geração que Move me mostrou que a gente tem direitos”
Isabelle Moura, 17 anos, mora no Grajaú, Zona Sul de São Paulo, e reflete sobre as dificuldades e potenciais do seu território no projeto Geração que Move
Por Unicef Brasil
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“Eu sou uma artista, já fiz dança, acrobacia, aéreo, grafitti… fiz de tudo”, relata Isabelle Moura, 17 anos, paulista nascida no Grajaú, zona sul da cidade, onde ainda vive com a mãe e os três irmãos. Ex-aluna do Circo-Escola, projeto sociocultural de sua região, Isabelle teve que deixar de lado a formação artística por conta dos horários escolares e da falta de recursos para estudar em cursos privados. “Se eu pudesse escolher um emprego, eu escolheria a dança, mas arte não é valorizada”.
O vínculo com o Circo-Escola levou Isabelle a conhecer diversas regiões da cidade às quais não tinha acesso, além de proporcionar conhecimentos valiosos sobre problemáticas presentes no seu dia a dia. Foi também a partir da rede que construiu que Isabelle chegou à iniciativa Geração que Move, realizado pelo UNICEF, Fundação Abertis e Arteris, em parceria com a Viração, em São Paulo.
O interesse em dar continuidade à formação social e política iniciada no Circo-Escola, bem como a vontade de descobrir novos lugares da cidade, mobilizou a jovem a integrar ao projeto. “No Geramove, a gente está conhecendo outros espaços e está compartilhando com outras pessoas, tomando conhecimento para poder ocupar esses lugares”, conta ela. “Saber que a gente tem direitos e que a gente tem que batalhar por esse acesso são coisas que as formações do projeto têm mostrado”, conclui.
No geral, não temos oportunidade geralmente entender que podemos ir além, então os moradores ficam achando que não tem direito para acessar outras coisas e acabam ficando só por aqui
Isabelle reconhece que há espaços para a efetivação de alguns direitos no seu território, entretanto faltam informações sobre como acessá-los, assim como qualidade nos serviços oferecidos. “Tem lugares aqui que a gente tem acesso mas não sabe ou quando vamos tentar usar não conseguimos”, afirma a jovem, lembrando que ficou mais de um ano para conseguir atendimento num hospital local.
Atualmente no 1º ano do Ensino Médio, a trajetória escolar de Isabelle não foi das mais fáceis. A adolescente esteve ao ponto de desistir de estudar na etapa final do Ensino Fundamental. O motivo: racismo. Isabelle, apesar de ser branca de pele, sofria preconceito por conta do cabelo crespo. “Eu era considerada a mais feia da escola, fiquei com depressão. Tentei alisar o cabelo uma época, mas sentia que estava me afastando de mim”, lembra ela. A mudança de escola foi decisiva. “Hoje eu sei dar nome para o meu cabelo. Ele é crespo”, ressalta com orgulho.
Os diferenciais do novo colégio foram o acolhimento, a abordagem pedagógica da problemática racial e as atividades culturais protagonizadas pelos jovens. Hoje com a pandemia, entretanto, o vínculo escolar foi bem prejudicado. “Eu tenho computador e internet em casa, mas me dá muita preguiça estudar online…”, reconhece a jovem e reflete sobre a baixa qualidade do ensino à distância ao qual tem tido acesso.
Entretanto, a pandemia abriu a possibilidade de levantar renda. Após mais de um ano buscando emprego, conseguiu uma oportunidade como jovem aprendiz de telemarketing. Embora o atual emprego não atenda seus sonhos, e o deslocamento quase diário até a empresa exija alto investimento – duas horas de trânsito e duas passagens de transporte público -, Isabelle considera que vale o esforço.
Com ambos os pais desempregados há anos, não há recurso suficiente para a jovem realizar suas atividades de lazer e ter acesso aos bens que deseja. “A gente tá sobrevivendo. Na verdade, na pandemia ainda é mais difícil, a gente sobrevive com o dinheiro do auxílio”, conta Isabelle.
Isabelle imagina um futuro em que atue como publicitária e consiga comprar um apartamento de frente para a Avenida Paulista. Embora admire e aprecie a cultura sambista do seu bairro e frequente os shows do Centro Cultural Grajaú, é no centro de São Paulo onde gosta de “sair com os amigos”, conta ela. As atividades nos finais de semana é o que Isabelle sente mais falta com a crise do novo coronavírus. “Gosto bastante de estar com os amigos, de sair com os amigos, e isso acabou dando uma afastada com a pandemia”, lamenta.
O Geração que Move tem suprido parte dessa demanda ao colocar Isabelle em conexão com outros adolescentes e jovens – pessoas de lugares diferentes, com experiências diferentes. “O projeto me ajuda bastante porque me faz sentir menos sozinha. A gente é escutado e pode falar pra todo mundo. Ainda mais agora na pandemia, é super bom poder conversar sobre temas como saúde mental, por exemplo. Essa troca me faz ver que há outros jovens que têm essas dificuldades, que eu não sou a única”, afirma.

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Texto originalmente publicado no blog do Unicef Brasil.