Mulheres no Futebol: a luta pelo seu espaço no esporte
O futebol feminino tem trilhado um percurso árduo e desafiador em busca da igualdade e do reconhecimento no mundo esportivo. Desde os primórdios do século XX, as mulheres enfrentam barreiras sistemáticas, preconceitos arraigados e concepções médicas equivocadas que buscavam restringir sua participação no futebol. A mídia segue moldando percepções e realidades, mas à medida que o futebol feminino continua a expandir sua popularidade e reconhecimento, torna-se essencial adotar medidas concretas para combater as disparidades e celebrar as conquistas das mulheres que persistiram mesmo diante de desafios históricos.
Por Fátima Tertuliano
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A história do futebol feminino no Brasil e em diversas partes do mundo é marcada por uma série de proibições e limitações. Durante grande parte do século XX, as mulheres brasileiras foram vetadas de jogar futebol por meio de um decreto que vigorou por quase quatro décadas. Essa proibição fundamentava-se no olhar machista de que a prática do esporte era prejudicial ao corpo feminino e desviava as mulheres de seus papéis maternos e de gênero. No entanto, as mulheres não se deixaram abater e continuaram jogando clandestinamente, muitas vezes em partidas beneficentes que arrecadavam fundos para causas sociais.
O Brasil não foi o único país a impor restrições ao futebol feminino. Na Inglaterra, por exemplo, a Federação Inglesa de Futebol publicou um documento em 1921 desestimulando a participação das mulheres no esporte. Essas medidas para conter o envolvimento feminino no futebol refletiam crenças patriarcais sobre o papel das mulheres na sociedade e os estereótipos de gênero que em alguns contextos se perpetuam até hoje.
Apesar dessas adversidades, as mulheres perseveraram e, gradualmente, vem conseguindo romper essas barreiras. A criação de torneios internacionais não oficiais, conhecidos como “Copas Clandestinas”, pavimentou o caminho para o gradual reconhecimento do futebol feminino. Somente em 1991 foi realizada a primeira Copa do Mundo FIFA de Futebol Feminino, marcando um marco significativo em direção à igualdade no esporte.
Apesar dos progressos, a desigualdade de gênero persiste no futebol. O futebol feminino frequentemente sofre com a falta de investimento, infraestrutura precária, discrepâncias salariais e falta de visibilidade em comparação com o futebol masculino. Esse problema transcende o âmbito esportivo, espelhando a luta global das mulheres por igualdade em todas as esferas da sociedade.
No Brasil, conquistas recentes como a obtenção de um uniforme exclusivo para a seleção feminina em 2019 e a transmissão televisiva da Copa do Mundo Feminina, marcaram avanços significativos. Além disso, a exigência da Conmebol para que os clubes participantes da Copa Libertadores da América tivessem equipes femininas reflete um esforço concreto para promover a igualdade de gênero no esporte.
A pesquisa de Nathália Fernandes Pessanha destaca a importância de compreender o contexto histórico que moldou as atitudes em relação ao futebol feminino e ressalta como essa luta transcende o esporte, representando a batalha das mulheres pelo direito de ocupar todos os espaços que desejarem.
À medida que o futebol feminino continua a expandir sua popularidade e reconhecimento, torna-se essencial adotar medidas concretas para combater as disparidades de gênero, fomentar a igualdade no esporte e celebrar as conquistas das mulheres que persistiram mesmo diante de desafios históricos. A trajetória do futebol feminino serve como um lembrete inspirador de que a busca pela igualdade é uma jornada contínua que se destaca pela resiliência e determinação das mulheres em conquistar seu lugar no cenário esportivo mundial.
Vivemos em uma sociedade construída sobre a base de significados que moldam a percepção dos indivíduos em relação ao mundo ao seu redor. Nesse contexto, as práticas midiáticas desempenham um papel crucial, pois não apenas refletem as dinâmicas sociais, mas também influenciam na formação de representações e na disseminação de determinados modos de pensamento. Conforme delineado por Stuart Hall em seu livro Cultura e Representação de 2016, a representação envolve a utilização da linguagem para transmitir inteligivelmente informações sobre o mundo ou apresentá-lo a outros.
Em uma investigação feita por Gabriela Freitas que analisou a maneira como a jogadora de futebol dos Estados Unidos, Megan Rapinoe, foi retratada pela mídia brasileira em 2019, torna-se evidente como a mídia frequentemente constrói molduras em torno de atletas femininas. Esse estudo de caso lança luz sobre a forma como os veículos de comunicação tendem a enquadrar as mulheres no esporte, revelando a interseção entre a posição da mulher na sociedade e no mundo esportivo ao longo do tempo. A análise da perspectiva midiática e social da figura feminina permite examinar criticamente o progresso que o futebol feminino e o próprio jornalismo esportivo trilharam para ganhar mais visibilidade nos meios de comunicação.
A abordagem da representação de mulheres atletas pelo jornalismo esportivo ganha importância à medida que se compreende que os veículos de mídia desempenham um papel vital na propagação de preconceitos e estereótipos. Com isso, a mídia se configura como um agente que define a forma como a mulher atleta é percebida por meio da linguagem utilizada para descrevê-la. Através de escolhas de palavras, enquadramentos, imagens e narrativas, os veículos de comunicação influenciam a maneira como o público em geral enxerga e interpreta as mulheres no contexto esportivo.
Historicamente, o futebol feminino e as mulheres que nele atuam enfrentaram e ainda enfrentam desafios substanciais em termos de reconhecimento, investimento e respeito em comparação com seus colegas masculinos. A mídia, muitas vezes, reforça essas desigualdades, relegando o futebol feminino a um espaço secundário e promovendo estereótipos que minimizam as habilidades e a seriedade das atletas mulheres. Por meio de representações distorcidas e, por vezes, condescendentes, a mídia perpetua ideias preconceituosas sobre as capacidades das mulheres no esporte.
No entanto, as coisas estão mudando. A crescente conscientização sobre a importância da igualdade de gênero tem levado a mudanças significativas na forma como as mulheres no esporte são representadas. Movimentos feministas, aliados a vozes influentes dentro do esporte e da mídia, têm pressionado por uma representação mais justa e precisa. A visibilidade aumentada de figuras como Megan Rapinoe, que não apenas brilham em campo mas também se manifestam em questões sociais, está ajudando a redefinir a narrativa em torno das mulheres no esporte.
A trajetória do futebol feminino e das mulheres atletas na mídia ilustra claramente como as representações moldam percepções e realidades. No entanto, à medida que a sociedade evolui, a mídia também evolui. O jornalismo esportivo, ao adotar uma abordagem mais inclusiva e precisa na representação das mulheres no esporte, desempenha um papel fundamental na desconstrução de estereótipos arraigados e na construção de um ambiente mais igualitário. Como catalisadora de mudanças culturais, a mídia tem a oportunidade de redefinir a narrativa em torno das mulheres atletas e, ao fazer isso, contribuir para uma sociedade mais justa e equitativa como um todo.
O Papel da Mídia na Luta pela Igualdade de Gênero no Esporte
A mídia desempenha um papel de destaque na construção de narrativas sociais e, portanto, possui um poder inegável na formação de percepções e valores na sociedade. Quando se trata da luta pela igualdade de gênero no esporte, a mídia se torna uma ferramenta fundamental para a promoção de mudanças significativas e duradouras. Ao moldar as representações e dar voz às histórias de mulheres no esporte, a mídia pode ser uma força transformadora na busca por equidade.
A visibilidade que a mídia concede a atletas femininas é crucial para quebrar estereótipos enraizados. Muitas vezes, a sub-representação das mulheres no esporte contribui para a perpetuação de ideias preconcebidas sobre as capacidades das mulheres nesse campo. Ao destacar as realizações, os desafios e os esforços das atletas, a mídia pode romper com esses estereótipos e mostrar ao público que as mulheres são tão capazes quanto os homens no mundo esportivo.
Além disso, a mídia tem o poder de influenciar a percepção pública das questões de gênero no esporte. Através de reportagens, entrevistas e análises, a mídia pode abordar tópicos como disparidade salarial, falta de investimento, condições de trabalho e oportunidades iguais de maneira aprofundada. Ao colocar essas questões no centro das discussões, a mídia pode despertar a conscientização pública e pressionar por mudanças tanto nas instituições esportivas quanto na sociedade em geral.
A mídia também pode atuar como um veículo para ampliar vozes femininas no esporte. Oferecer plataformas para que atletas, treinadoras, comentaristas e especialistas em esportes femininos compartilhem suas experiências e opiniões não apenas destaca suas contribuições, mas também desafia a noção de que o esporte é um domínio exclusivamente masculino. Isso não apenas inspira as futuras gerações de mulheres, mas também promove uma mudança cultural ao mostrar que as mulheres têm um lugar legítimo e influente no esporte.
Além disso, a mídia pode pressionar por mudanças institucionais ao questionar as políticas e práticas discriminatórias e desiguais no esporte. A exposição de casos de disparidades de gênero e as críticas construtivas podem forçar as organizações esportivas a reavaliar suas abordagens e implementar medidas concretas para promover a igualdade. A cobertura constante e aprofundada de questões podem exercer pressão para a criação de políticas mais justas e inclusivas.
No entanto, a mídia também deve assumir a responsabilidade de tratar as questões de gênero com sensibilidade e precisão. Evitar sensacionalismo, estereótipos e simplificações excessivas é fundamental para não comprometer os esforços pela igualdade de gênero. O jornalismo responsável e bem informado é essencial para garantir que a mídia contribua positivamente para a causa da igualdade no esporte.
Em resumo, a mídia é um poderoso agente de mudança na luta pela igualdade de gênero no esporte. Sua capacidade de moldar percepções, influenciar discussões e pressionar por mudanças faz dela uma aliada crucial nessa jornada. Ao amplificar as vozes das mulheres no esporte, questionar normas discriminatórias e promover representações justas e precisas, a mídia pode desempenhar um papel significativo na criação de um futuro esportivo mais equitativo e inclusivo para todos.
Referência
HALL, Stuart. Cultura e Representação. Rio de Janeiro: Editora PUC-Rio: Apicuri, 2016.
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