MUDE com Elas: projeto debate os avanços necessários para a inclusão de pessoas com deficiências no mercado de trabalho

Você já parou para pensar por que existem poucas (ou nenhuma) pessoa deficiente atuando em seu ambiente de trabalho? Pessoas com deficiência têm direito a serem contratadas e a construir uma carreira, mas muitas lideranças empresariais ainda não se importam com isso.

Por Ramona Azevedo e Thaynara Floriano, da redação.

Não é preciso procurar muito para encontrar empresas que atendam apenas a um grupo social – quando se trata da contratação de seus colaboradores. E mais: todos, todas e todes nós sabemos bem que são, em sua maioria, homens cis-hetero, brancos e não-deficientes. Uma contradição e tanto para o nosso país, já que o Brasil é dividido em diversas classes sociais, culturas, etnias e, por isso, cada pessoa que compõe a sociedade brasileira apresenta demandas diferentes para si.

Para garantir que a inclusão de qualidade seja uma realidade no mercado de trabalho brasileiro, é fundamental implementar ações afirmativas que busquem ampliar a diversidade dentro das empresas e das equipes. É necessário e urgente olhar para o campo de Diversidade, Equidade e Inclusão na prática, para que assim, essas pessoas também possam garantir o pleno exercício da sua cidadania e dignidade através do trabalho. Além disso, sabemos que ações afirmativas eficientes colaboram para a diminuição e, a longo prazo, para o fim da discriminação no ambiente de trabalho, bem como na sociedade como um todo – – através do convívio com a pluralidade de ideias, culturas e realidades.

7º encontro de reflexão: provocações para transformar realidades

No último dia 26 de outubro aconteceu o 7º Encontro de Reflexão do projeto MUDE com Elas. Dessa vez, a iniciativa abriu o debate para refletirmos sobre o que não tem sido feito para a inclusão de pessoas deficientes no mercado de trabalho. Participaram do encontro: 

  • Heloisa Trenche, da Ação Educativa, pesquisadora de educação, consultora de produção pedagógica, gestora de projetos sociais e deficiente auditiva. 
  • Luciana Viegas, pedagoga, professora da Rede Estadual de São Paulo, co-idealizadora do VNDI (Vidas Negras com Deficiência Importam), autista ativista e mãe de autista. 

A atividade foi mediada por Lucia Udemezue, Coordenadora do MUDE com Elas pela Ação Educativa.

Inclusão no Mercado de Trabalho

Segundo o IBGE, a taxa de participação das pessoas com deficiência no mercado de trabalho no Brasil é de 28,3% – menos da metade do índice registrado entre as pessoas sem deficiência, que é de 66,3%.

Em 2019, 18,2% das pessoas com deficiência estavam abaixo da linha da pobreza. Entre as pessoas com deficiência visual, essa porcentagem aumentou para 22,5%.  Esses dados comprovam que a ausência de políticas inclusivas colabora para a não garantia e baixo índice de desenvolvimento social de pessoas com deficiência. 

O Brasil possui uma grande quantidade de pessoas que vivem com alguma deficiência e que, por muito tempo, tiveram o acesso aos seus direitos negado ou dificultado. Neste sentido, a criação de uma legislação que contemplasse a garantia de direitos para PCDs foi fundamental. Hoje,  o Estatuto da Pessoa com Deficiência é a lei mais abrangente, no que tange à proteção e à promoção de direitos das pessoas com deficiência no Brasil. 

Mas o Estatuto da Pessoa com Deficiência assegura às pessoas com deficiência o direito ao trabalho, de sua livre escolha, em ambiente acessível e inclusivo?

A resposta é não.

E isso porque nem todas as pessoas têm acesso aos seus direitos. Muitas empresas ainda não cumprem a legislação e, para que a sociedade inteira passe a entender a importância da diversidade e da proteção dos direitos sociais para esse grupo populacional, principalmente no mercado de trabalho, é fundamental que a educação entre como aliada no trabalho para essa transformação social. 

Pessoas com deficiência já eram afetadas de forma desproporcional antes do coronavírus e de suas consequências econômicas. Mas, durante a pandemia muitas empresas não quiseram se comprometer, pensando em direitos que teriam que garantir aos trabalhadores com deficiência no período de crise ou por acreditar que PCDs não conseguiriam cumprir com as suas atividades durante a pandemia. A verdade é que se os empregadores não estavam dispostos a investir no desenvolvimento de projetos de Diversidade, Equidade e Inclusão antes do coronavírus, imagine durante a crise.

A pandemia da Covid-19, negligenciada pelo atual governo, por exemplo, tornou a questão da empregabilidade de pessoas com deficiência ainda mais complexa, pois o risco à saúde se somava ao risco do desemprego, em função do despreparo do mercado para lidar com os diversos desafios no âmbito econômico, que foram resultados da emergência sanitária global.

Os trabalhadores com deficiência estão em busca constante de uma inclusão qualificada, que proporcione uma cidadania plena. E essa não é uma questão assistencialista. Trata-se da luta por direitos, e essa luta deve ser de todos!

E para as empresas não basta só garantir a contratação de PCDs.  As políticas de permanência específicas para esses colaboradores é fundamental para que eles sejam efetivamente incluídos no ambiente de trabalho. 

“Quando comecei a trabalhar, comecei a perceber mais a importância de algumas responsabilidades e comecei também a me cobrar mais. Uma cobrança, de certo modo até capitalista: para ser uma pessoa mais perfeita, de corpos perfeitos e ideais, que devam atender a um padrão. E nessa busca percebi como ficava extremamente exaurida e cansada, porque, por exemplo, eu tentava dar conta  de ouvir todas as crianças, todos os adultos, a todo momento”.

Heloisa Trenche

profissionais que se comuniquem em libras, por exemplo, são algumas das ações que garantem as contratações de pessoas com deficiência não só por obrigatoriedade, mas para o início da inclusão de pessoas que já fazem parte da sociedade, mas viveram muitos anos de exclusão.

“A lei garante intérprete para pessoas surdas, garante a acessibilidade dos espaços, mas por que então as pessoas com deficiência não estão no mercado de trabalho? Você sabia que as pessoas com deficiência intelectual têm o direito e PODEM trabalhar? Mas por que elas não estão? Porque se entende que, para ser um profissional produtivo e funcional, não é necessário a ajuda de ninguém. Você não pode precisar de ninguém, é preciso ser independente. Mas isso bate de frente com a forma como nos organizamos no ambiente de trabalho, que é naturalmente acessível – afinal, precisamos de equipes de trabalho, e nenhum de nós sozinho conseguiria fazer essa estrutura funcionar.”

Luciana Vegas

A empresa deve se preparar não só para receber pessoas com deficiência, mas também para que seus funcionários, como seres participantes de uma sociedade inclusiva, se adaptem às necessidades das pessoas com deficiência e não o contrário. Por isso, também é interessante que o departamento de RH oriente o desenvolvimento de um guia de relacionamento e de inclusão no trabalho.

 “É preciso dar mais destaque e naturalizar questões como a acessibilidade comunicacional. Ela vai além de colocar um intérprete de Libras, é sobre linguagem simplificada, trabalho apoiado, equipamentos bem configurados (tempo de permanência), audiodescrição, legendas, dublagem. Quando uma pessoa com deficiência solicita esse tipo de acesso para viabilizar o seu trabalho, o mercado entende como um excesso, como um trabalho extra, quando na verdade deveria ser uma questão natural. É preciso que exista um esforço para nos organizarmos como sociedade e alterar o nosso parâmetro de normal. O nosso parâmetro de normal precisa ser o inclusivo, assim, será natural que as pessoas com deficiência tenham acesso e não se sintam disfuncionais”.

Luciana Vegas

A inclusão é algo que nós, enquanto sociedade, precisamos aprender e exercitar. Sua empresa deve estar disposta a contribuir para a inclusão de PCDs no mercado de trabalho, assim como as escolas, os bares, os restaurantes e todos os outros espaços sociais. 

É comum encontrar quem  nunca conviveu com pessoas com deficiência, por isso, a comunicação e a educação aberta sobre temas que trabalhem a conscientização e a compreensão a respeito da Diversidade, Equidade e Inclusão para toda a sociedade é o início de um Brasil menos desigual e mais democrático.

O MUDE com Elas é uma iniciativa que reúne a Ação Educativa e Terre des hommes Alemanha (Tdh), com apoio da Viração Educomunicação por meio da Agência Jovem de Notícias.

Ver +

Leave a Reply

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *