Juventude nem – nem ou juventude sem – sem?

Como a pandemia e a negligência do estado tem prejudicado o futuro da juventude? Futuro? Qual futuro?

Por Victoria Souza

Há algum tempo a possibilidade de futuro, de ter mais oportunidades profissionais, de progredir financeiramente, de se educar academicamente vem sendo negada aos jovens, em especial aos jovens espalhados por diversos territórios em vulnerabilidade social do nosso país.

A pandemia minou oportunidades e se apresentou como uma barreira, um fator a mais de uma realidade já difícil e complexa. Milhares de jovens estão cada vez mais longe das escolas e com menos chances de conseguir um emprego. Pensando em um jovem que vive na periferia, essa situação é ainda mais difícil, uma vez que muitos desses jovens já antes da pandemia estavam sustentando famílias inteiras com seus salários de estagiários e já enfrentando dificuldades financeiras por conta da crise de desemprego crescente no país. 

De acordo com o IBGE, a taxa de desemprego entre os jovens foi de 27,1% só no primeiro semestre de 2020, mais do que a média geral que está em torno de 12,2%. Ainda de acordo com a pesquisa, a Covid e o desemprego têm prejudicado muito mais os jovens de 18 a 25 anos do que as outras faixas etárias (G1.com, 2020).

Imagem: Sintracom Londrina / Reprodução

Conforme dados da Organização Internacional do Trabalho, os jovens que não têm acesso a oportunidades de emprego, ao entrarem no mercado de trabalho enfrentam consequências contínuas ao longo de suas vidas profissionais, o que prejudica demais suas carreiras, já que diversas empresas continuam com muitas exigências profissionais e as que pararam de exigir tanto, também não dão condições suficientes para o jovem continuar no emprego. De fato, a inclusão social no ambiente empresarial ainda é um desafio.

Falando sobre o número de jovens que estão fora da escola, tivemos um grande aumento após a pandemia, o que significa que mesmo com aulas online, muitos jovens desistiram de estudar. E esse número só não foi maior graças a movimentos independentes que estão apoiando milhares de jovens a se preparem de alguma forma para mais uma maratona de vestibulares e provas que em nenhum momento foram canceladas por conta da pandemia.

Em 2020, o número de crianças e adolescentes de 6 a 17 anos fora da escola passou para 1,5 milhão. A suspensão das aulas presenciais, somada à dificuldade de acesso à internet e à tecnologia, entre outros fatores, fez com que esse número aumentasse ainda mais (Agência Brasil).

Imagem: Shutterstock

As desigualdades sociais para os jovens nunca foram tão evidentes e os números são assustadores.

O que podemos interpretar desses números é que a pandemia, apenas piorou o que já era ruim e evidenciou uma realidade sufocada há anos: existe uma geração esquecida, sem aulas, sem empregos e sem esperanças de um futuro. E isso tudo é inaceitável, ou pelo menos deveria ser.

Adicione a essa situação já crítica o caos político e econômico que vivemos e tente responder: como é possível sairmos dessa fase tão complicada e principalmente, como os jovens podem superar toda essa situação, uma vez que “na vez deles”, a escola está abandonada e os empregos cada vez mais escassos? E digo “superar” pois essa é sempre a atitude esperada pela sociedade: que as pessoas apesar das adversidades que enfrentam, superam essas situações e se tornem o exemplo para as próximas gerações: o mito da meritocracia!

Talvez a questão precisasse ser reformulada para: como é possível dar às próprias escolas condições dignas e suficientes para preparar esses jovens para o mercado de trabalho? Ou então, como disseminar habilidades socioemocionais para que eles enfrentem de forma assertiva essa crise que estamos vivenciando? Talvez ainda: como auxiliar muitas famílias a terem estrutura financeira e/ou emocional para auxiliar esses jovens a enfrentar os desafios da vida profissional, considerando uma pandemia e quase dois anos longe das escolas?

Pensando dessa forma, a reflexão fica muito mais importante para entender como  oportunidades básicas estão sendo negadas às próximas gerações, como acesso adequado ao conteúdo que pode prepará-los para o Enem e diversos vestibulares por exemplo ou o acesso à internet, que é algo corriqueiro e comum na vida de um jovem da periferia que muitas vezes não tem como acompanhar o conteúdo porque não tem internet, além de precisar dividir o celular, com várias pessoas da sua casa. 

Parece “chover no molhado” quando se fala na criação de políticas públicas adequadas para essa juventude que passou da fase nem – nem (nem estuda e nem trabalha) para a fase sem – sem (sem estudo e sem trabalho).

Uma vez que esses jovens continuam com seus direitos sendo negados pelo Estado, como pedir que estudem e não desistam da escola?

Como é possível “brigar” em pé de igualdade com pessoas que estudaram a vida inteira em colégios particulares, fizeram cursinhos e não enfrentaram os mesmos desafios de quem nasce em comunidades carentes: o mito da meritocracia batendo novamente na nossa porta.

Como é possível competir em vagas de multinacionais que exigem que um estagiário tenha inglês e espanhol fluente, quando muitos jovens ainda não absorveram o básico, pensando em português e matemática?

Todas essas questões são urgentes e já passou da hora de refletirmos e agirmos em torno delas. Vivemos um desgoverno sem freio algum que está cada vez mais enterrando a juventude em um espaço que ela não merece estar.

A nossa expectativa de futuro é ameaçada a cada vez que alguém lança uma fake news, a cada vez que alguém quer retroceder as conquistas da nossa sociedade, a cada momento que a educação continua sendo desprezada, a cada vez que um jovem é morto apenas por morar em uma favela. 

Imagem de ISTOCK

Por isso continua sendo necessário que nos mobilizemos, que estudemos, que sejamos protagonistas desse futuro que queremos e merecemos ter. Não consigo enxergar outra saída que não sejam os próprios jovens a lutarem por esse futuro e cobrarem medidas da sociedade envolvendo a esfera pública, privada, terceiro setor e toda a sociedade que, por algum motivo ainda não despertou, mas que precisa despertar para a realidade das juventudes.

Que lutemos por um futuro não apenas para a nossa juventude, mas também para as próximas juventudes que precisam existir!

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