Infectologistas explicam a polêmica abordagem do HIV em Malhação

Da Redação | Ilustração: Natália Forcat (Acervo Viração)

O ano começou com polêmica! Lucinha Araújo, mãe do cantor Cazuza, morto em 1990 vítima de Aids, fez dura crítica à abordagem do seriado Malhação, da TV Globo, de pessoas que vivem com o vírus HIV. No seriado, o personagem adolescente Henrique (vivido por Thales Cavalcanti) vive com HIV, mas escondia sua sorologia dos colegas da escola. Numa aula de educação física, dá uma cabeçada em sua colega Luciana (vivida por Mariana Moschen), durante uma partida de basquete. Por essa razão, Thales revela  constrangido que vive com HIV e a menina é encaminhada à chamada profilaxia pós-exposição (PEP), uma espécie de tratamento que uma pessoa exposta ao vírus deve fazer para evitar que seja infectada.

Lucinha Araújo acredita que o encaminhamento à PEP da personagem Luciana é descabida, além de reforçar o estigma às pessoas que vivem com o vírus: “Depois de 30 anos de trabalho para combater o preconceito e informar corretamente as formas de transmissão do HIV, vemos um programa destinado ao público jovem aconselhar soropositivos a não praticar esportes, a mostrar um médico receitar medicamento antirretroviral numa situação onde dois jovens dão uma cabeçada é no mínimo de chorar”, afirmou ela, por meio de nota publicada no site da Sociedade Viva Cazuza, da qual é presidente.

Em razão dessa polêmica toda, procuramos entender melhor a questão, entrevistando as infectologistas Rosa Alencar e Simone Queiroz, do Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids de São Paulo. Confira, a seguir, a entrevista:

No seriado Malhação, da TV Globo, uma adolescente que deu uma cabeçada em um colega soropositivo durante um jogo de basquete foi encaminhada para profilaxia pós-exposição (PEP). Esse encaminhamento é correto para esse tipo de situação?

Sim, embora o risco seja baixo considerando a natureza da exposição e que a pessoa vivendo com HIV está em tratamento com carga viral indetectável. Segundo o protocolo do Departamento de DST/AIDS e HV do Ministério da Saúde, contato de sangue de pessoa sabidamente HIV positivo com pele não íntegra, ou seja, que apresenta ferimentos, fissuras ou outras lesões, é considerado de risco para a transmissão do HIV e tem indicação de PEP.

Um adolescente soropositivo pode participar de atividades esportivas como um jogo de basquete, que envolve contato e risco de lesão?

Não existe recomendação de restrição de prática de esporte neste caso, a não ser que sua condição clínica possa ser agravada pela prática de alguma atividade física.

Quais são as formas mais comuns de contrair o vírus do HIV? Quais as diferenças entre HIV e Aids?

As principais formas de transmissão do HIV são através da relação sexual desprotegida, do compartilhamento de seringa e da mãe para o filho (na gestação, durante o parto ou na amamentação). Uma pessoa com HIV pode não desenvolver Aids (que é a condição clínica que indica uma infecção mais avançada, quando as células de defesa do organismo foram mais atingidas), principalmente se descobrir a infecção e iniciar o tratamento precocemente, devendo ter boa adesão aos medicamentos.

No seriado, o garoto soropositivo foi infectado verticalmente (de mãe para filho), você pode explicar como funciona esse processo?

Na ausência de qualquer abordagem para se prevenir a transmissão, a taxa de transmissão do HIV de uma mãe infectada para o seu filho é em torno de 20%.  Em situações em que a grávida segue todas as recomendações médicas, a possibilidade de infecção do bebê reduz para níveis menores que 1%. As recomendações médicas são: o uso de remédios antirretrovirais combinados na grávida e no recém-nascido, o tipo de parto definido de acordo com a carga viral da gestante no final da gestação e a não amamentação.

Uma pessoa que vive com HIV vive normalmente? Que cuidados são necessários?

Uma pessoa que tem seu diagnóstico realizado precocemente e inicia o tratamento antirretroviral precoce com boa adesão ao tratamento e resposta adequada pode ter longevidade comparável com aqueles que não são infectados com o vírus com boa qualidade de vida. Daí a importância de todas as pessoas com vida sexual ativa ou que compartilharam seringas e agulhas no uso de drogas e gestantes realizarem o teste para o HIV.

Embora os tratamentos atualmente disponíveis tenham mudado radicalmente a evolução da infecção pelo HIV e Aids, é importante ressaltar que a doença ainda não tem cura e o tratamento dura a vida inteira.

 

 

Jornalista, professor e educomunicador. Responsável pelos conteúdos da Agência Jovem de Notícias e Revista Viração.

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