HOMENS NÃO CHORAM?

Reflexões sobre a  importância de se falar de sentimentos e emoções masculinas, que historicamente foram invalidados ou anulados desde a primeira infância, causando marcas profundas que ao crescer são refletidas em comportamentos e personalidades enrijecidas e saúde mental afetada.  

Por Iane Nobre

Começo esse texto colocando em questionamento uma frase popularmente dita como afirmação: homens não choram?

Trago essa frase para fazermos uma reflexão acerca dos sentimentos e emoções masculinas, uma vez que percebemos que homens, especialmente cisgênero e héteros, não costumam ocupar com frequência o setting clínico. 

Essa população em geral, tem seus sentimentos invalidados desde a primeira infância e ao crescer não percebem a importância da saúde mental, sendo em sua maioria, condicionados a acreditar que ‘falar sobre sentimentos é assunto proibido’ e o tema pode afetar o que chamamos de “masculinidade”.

Há um extenso “catálogo” de frases que além de trazerem o machismo enraizado, reforçam a anulação do sentir desses homens, como: “isso não é coisa de homem”; “parece uma menininha chorando”; “seja homem”; “bebe que nem homem”.

O impacto desses dizeres pode parecer pequeno a princípio, mas contribuem para um ciclo de atravessamentos.

Homens que, por não conseguirem e não terem espaço para expressar suas emoções, desenvolvem mais facilidade em adquirir algum vício, que surge em sua maioria, pela necessidade de suprir a falta relacionada às emoções que não são trabalhadas e validadas.

De acordo com pesquisa realizada pelo Instituto Ideia em 2022 cerca de 80% dos homens no Brasil nunca fizeram terapia, um número alto e preocupante, que nos faz refletir sobre como a saúde mental masculina vem sendo cuidada e percebida.

Esse cenário também reflete para um crescimento  no número de feminicídios – uma mulher é morta no país a cada 6 horas -, violência contra mulheres, violência no trânsito envolvendo homens, entre outros que podemos considerar uma dificuldade no acesso e cuidado com a saúde mental masculina.

Os números evidenciam que ao seguirmos nessa cultura de que “homens não choram”, vamos assistir crianças se tornando homens adultos adoecidos que não reconhecem os próprios sentimentos e a importância de exporem suas fragilidades.

Mas é sabido que atravessar essa cultura, não é fácil, nem simples, mas é necessário pessoalmente e socialmente. Nós enquanto seres humanos somos conduzidos por nossos sentimentos e emoções e nem sempre sabemos lidar sozinhos com tudo que se passa e é preciso reconhecer que precisamos de ajuda.  

Agora, me dirijo a você, que se identifica como homem, que está lendo e deixo um recado: 

Entender e reconhecer que precisa de ajuda, é um ato revolucionário, que demanda coragem e estar disposto ao processo de mudança. Permitir a transformação em você também reflete em toda a sociedade. 

Permita-se!

Iane Nobre tem experiência em atendimentos com adolescentes e adultos, e acredita que todes tem o direito de uma escuta qualificada e um espaço de acolhimento para partilhar sua história de vida. É Psicóloga Parceira no Canto Baobá – Espaço especializado em Saúde Mental e diversidade, com ênfase no enfrentamento às violências estruturais.

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