Entendendo a sigla LGBTQIAPN+

Por Juliana Ribeiro, do Canto Baobá

Ao falar da sigla LGBTQIAPN+, estamos falando de uma série de pessoas que vivem diariamente uma luta por direitos (básicos) e respeito. Também estamos falando sobre:

Diversas orientações sexuais e identidades de gênero. Mas para que você consiga entender melhor, iremos trazer alguns conceitos básicos antes de explicar o que cada letrinha significa.

Você sabe o que significa identidade de gênero?

O gênero é a convicção pessoal de reconhecimento. É um processo interno e individual de reconhecimento de seu próprio gênero. Ele pode estar dentro de um contexto binário (homem ou mulher) ou não. Pode estar dentro de um contexto cis (gênero designado socialmente ao nascimento é igual ao gênero de identificação) ou trans (gênero designado ao nascimento é diferente do gênero de identificação).

O gênero também é responsável por, historicamente, ditar papéis, comportamentos, oportunidades e responsabilidades. Quer fazer um teste?

Responda por aí:

Quais são os afazeres domésticos atribuídos aos homens? E às mulheres?

Em contraponto:

Quais são os direitos de acesso (e isso vai de saúde a lazer) de pessoas não binárias?

O que é ser uma travesti na sociedade?

Se você conseguiu responder algumas dessas perguntas rapidamente, enquanto para outras precisou repensar e pensar, é justamente porque há papéis sociais delimitados para uma parcela da população, enquanto possibilidades de existências são negadas na outra ponta. Isso é o que chamamos de papéis de gênero.

Agora que você sabe o contexto geral de gênero, é hora de falar sobre orientação sexual.

A orientação sexual é por quem você se atrai romanticamente /fisicamente/ emocionalmente.

A não atração/desejo físico/romântico também existe: se chama Assexualidade. A assexualidade não exclui a orientação sexual, viu?

Se o gênero independe de genitálias (veja que até o momento falamos apenas de concepções sociais, históricas e individuais acerca de reconhecimento no mundo e afetividades),  onde ficam as categorizações por genitália?

Em algumas leituras você encontra por “sexo biológico”. Aqui, iremos chamar de classificação científica de espécies.

A padronização e classificação são conceitos em que a ciência caracteriza diferentes espécies.

Os parâmetros de caracterização são diversos: cromossômicos, genital (a utilizada para caracterizar pessoas quando esse humane ainda nem nasceu), composição hormonal e outros caracteres sexuais secundários.

Basicamente:

Para ser designado homem ao nascer , preciso nascer com um pênis.

Para ser designada mulher ao nascer,  preciso nascer com uma vagina.

E quem nasce com as duas características?

Chamada de “Atipia Genital” (nascer com duas genitálias), nascer intersexo é o rompimento de padrões que não se enquadram no contexto binário.

Ser intersexo também leva em consideração fatores hormonais que também difere do contexto dito acima (ex: ovário policístico, pessoas vistas socialmente como mulheres com cromossomos XY, pessoas vistas socialmente como homens com cromossomos XX, etc).

É importante que você entenda que se o gênero é o entendimento individual acerca de como você se identifica no mundo, não é correto atribuir genitália ao gênero, ok?

Genitália NÃO define identidade de gênero.

Quem eu sou se manifesta na forma com que eu falo, como me visto, meus comportamentos, certo?

Nota 10 pra ti! Correto, e isso se chama “expressão de gênero”.

É a forma em que a pessoa deseja se expressar em um determinado contexto em relação aos padrões sociais de gênero. Se manifesta pela aparência física (roupa, cabelo, acessórios), falas, padrões comportamentais, nomes e referências pessoais.

Sua expressão de gênero muda também conforme onde está e o que deseja expressar. É como pensar em você na praia vs você no trabalho vs você no rolê com us amigues.

Todas as versões são você, mas a forma com que você se expressa vai mudar dependendo do que deseja/ ambiente/ circunstâncias.

É isso?

Basicamente, sim.

Mas para que fique mais fácil para o entendimento, iremos ilustrar onde cada denominação descrita nas páginas acima se enquadram em nós, ok?

Arte: Canto Baobá

Antes de falar sobre a sigla, e sim, estamos falando sobre todo um contexto histórico que é necessário para que esse texto saia de forma condizente ao que prezamos enquanto Canto Baobá, precisamos falar sobre as lutas.

E aqui não foi com Stonewall, viu?

Voltando brevemente para 1970

Em plena Ditadura militar, os bares gays eram o point da revolução.

Por meio de jornais, cartilhas e panfletos, o movimento lésbico e gay se organizavam para reivindicar seus direitos de existência.

A população transexual também fazia parte do movimento, de forma marginalizada. Os bissexuais só passaram a ter voz ativa reconhecides como bissexuais em 1990, com o “Manifesto Bissexual”.

Em 1978, existia um jornal chamado “O lampião da esquina”:

Primordial para a luta LGBTQIAPN+, o “Lampião da esquina” foi considerada a primeira revista LGBT. Tinha como objetivo dizer “Não ao gueto e, como consequência, sair dele”.

O jornal denunciava prisões de pessoas LGBT por serem LGBT (chamada de Operação Sapatão), aliado às causas sociais como pautas indígenas .

Mesmo sendo um jornal declaradamente de esquerda, fazia críticas à própria esquerda que considerava que lutar pelo direito gay era fugir da pauta principal (lutar contra o capitalismo).

Deixou de circular em 1981 e mesmo sendo focado na população considerada Gay, foi importante para que abrissem caminho para outras publicações, como a:

Chanacomchana – 1981

Em 1978, o Lampião deixou pela primeira vez que mulheres escrevessem no jornal. O texto “não somos anormais” foi o pontapé para que, em 1981, o jornal chanacomchana nascesse.

Era um jornal para pautas lésbicas, associado a GALF (Grupo Ação Lésbica Feminista – 1981).

FERRO’S BAR (centro de SP)

Era onde a Chanacomchana era vendido. Os donos do bar não aprovavam sua veiculação. No dia 19 de agosto de 1983, barraram a entrada de lésbicas e do jornal. A GALF lutou, organizou um protesto, chamou a imprensa e fez os donos do bar voltarem atrás e permitirem que as ativistas distribuíssem o folhetim ali. Nasce o Dia do Orgulho Lésbico no Brasil.

Foi muita luta para chegar até aqui. Luta essa desigual, branca, cisgênera, mas importante para que hoje conseguíssemos estar. Ainda há muito o que fazer. Muito mesmo.

Em um país que lidera o Ranking de assassinato de pessoas trans e travestis pelo décimo terceiro ano consecutivo, que faz a maior parada LGBTQIAPN+ do mundo não abordar, em nenhum de seus anos, pessoas assexuais, arromânticas, intersexo e demais letras que não possuem tanta visibilidade quanto as quatro primeiras (e de forma desigual), há muito o que mudar.

Falta respeito. Apoio. Entre nós, para nós.

Mas agora que você leu o contexto, vamos pensar em cada pessoa representada?

Lésbica

Bandeira Lésbica. Ilustração: Canva Design

​​É uma Orientação Sexual.

Pessoa que se considera socialmente enquanto mulher, que se relaciona afetivamente com outras pessoas que se consideram socialmente enquanto mulheres.

Mas é também considerado um movimento político, sabia?

Para entender mais sobre o assunto, recomendamos a reportagem “Sapatão não-bináries: não é só sobre amar mulheres”, de Helena Bertho, escrita em agosto de 2021 publicado na Revista Azmina.

Bandeira Gay. Ilustração: Canva Design

Gay

É uma Orientação Sexual.

Pessoa que se considera socialmente enquanto homem, e que se relaciona afetivamente com outras pessoas que se consideram socialmente enquanto homens.

A origem da palavra Gay se remetia, na língua inglesa no século XIX a algo alegre, despreocupado e promíscuo. Com o avanço da luta LGBTQIAPN+, o termo foi ressignificado, tornando o que conhecemos hoje.

Bissexual

Bandeira Bi. Ilustração: Canva Design

É uma Orientação Sexual – Pessoa que se relaciona afetivamente com pessoas de mais de um gênero.

A bissexualidade é uma orientação definida (com manifesto e registros históricos)  porém muitas vezes vista como uma fase/transição/ não vista.

Uma curiosidade:

a bissexualidade aparece nos escritos gregos, japoneses, romana e rituais indígenas, em algumas dessas culturas relatados como sexualidade das deusas e deuses.

Legal, né?

Transexual

Bandeira trans. Ilustração: Canva Design

É uma identidade de gênero.

A Transexualidade é um termo guarda-chuva (uma representação que abrange diversas e múltiplas outras identidades de gênero).

Representa pessoas em que sua identidade de gênero difere da identidade de gênero atribuída ao nascimento.

A identidade de gênero transexual pode estar dentro do contexto binário ou não.

Pessoas transfemininas – identidade de gênero trans que possuem expressões femininas (travesti e pessoas não binárias que possuem expressão feminina).

Pessoas transmasculinas – identidade de gênero trans que possuem expressões masculinas.

Queer

Bandeira Queer. Ilustração: Canva Design

É uma Identidade de gênero e também é uma orientação sexual.

Representa todas as pessoas que não se consideram cisgêneras (identidade de gênero atribuída ao nascimento é a mesma de reconhecimento) ou heterossexuais (pessoas que gostam do gênero oposto pensando em  uma lógica binária homem-mulher), que não se sentem representadas pelas demais siglas.

Lembrando que todas as siglas descritas estão em constante mudança!

A luta por espaço e reconhecimento é constante!

Intersexo

Bandeira Intersexo. Ilustração: Canva Design

É uma identidade de gênero.

Pessoas em que suas características genitais e/ou genéticas e/ou, hormonais e/ou cromossômicas não se enquadram ao que é socialmente lido como feminino ou masculino.

Pessoas intersexo muitas vezes não sabem que são intersexo e não têm consciência de seu próprio gênero por conta da violência médica e do apagamento social de seu gênero.

Por meio de cirurgias e/ou tratamentos para o que não é doença, há a “adequação” da pessoa em algum gênero binário.

Bandeira Assexual. Ilustração: Canva Design.

Assexualidade

É um espectro.

Significa a Ausência total, parcial, condicional ou circunstancial da atração sexual por outras pessoas.

Não tem nada a ver com crenças religiosas ou patologias, aliás, alinhar esses dois tópicos mencionados à assexualidade é uma violência cotidiana e infelizmente muito comum.

É um termo que abrange uma série de espectros assexuais, que explicaremos abaixo:

Existem muitos espectros Assexuais além dos citados. Para estudo e conhecimento, recomendamos o Coletivo AbrAce e o site https://aroaceiros.com (twitter e Facebook: @aroaceiros).

Arromanticidade

Bandeira Arromântica. Ilustração: Canva Design.

É um espectro.

Assim como a Assexualidade, a Arromanticidade é um termo que abrange uma série de outros espectros Arromânticos. A bandeira acima é a bandeira representativa da Arromanticidade, mas cada espectro possui sua própria bandeira.

A Arromanticidade é a ausência total, circunstancial ou parcial da atração romântica.  A Arromanticidade é diferente da Assexualidade, viu? Atração romântica e sexual não significam a mesma coisa e uma pessoa arromântica pode ou não ser assexual.

Bandeira pansexual. Ilustração: Canva Design

Pansexualidade

É uma Orientação Sexual.

Pessoas Pansexuais se atraem por pessoas, independente de seu gênero.

Não significa promiscuidade, não significa não monogamia.

Também não é um movimento de exclusão aos bissexuais.

É uma orientação sexual definida, com manifesto e muita história!

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Não Binaridade

É uma identidade de gênero.

Pessoas em que seu gênero não se enquadra no contexto binário homem-mulher. É um termo guarda-chuva que abrangem outros gêneros não definidos como masculino ou feminino ou o não ter um gênero.

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Agora que você recebeu essa mega aula de gênero, sexualidade e história, é com você: compartilhe esse conteúdo, ein?!

Abaixo, colocamos nossa referências e textos complementares que foram fundamentais para a elaboração desse documento.

Um abraço e até o próximo texto!

Referências e Textos Complementares

A trajetória e as conquistas do movimento LGBTI brasileiro – NEXO JORNAL

FERRO’S BAR: COMO SURGIU O DIA DO ORGULHO LÉSBICO NO BRASIL – Gama Revista UOL

Linha do tempo dos direitos LGBT – Grande Reportagem, UOL

O Movimento Homossexual no Brasil – PUC RIO

Livro “Saúde LGBTQIA+ : Práticas de cuidado transdisciplinar”

ilustração “The Gengerbread Person”

Apresentação da palestra que o Canto Baobá assistiu sobre Assexualidades com o @coletivoabrace

Publicações sobre arromanticidade do @aroaceiros

Manifesto Panssexual atualizado de 2021“Sapatão não-bináries: não é só sobre amar mulheres”, –  Revista Azmina.

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