Entenda a Reforma da Previdência e seu impacto nas juventudes

|Por: Moisés Maciel | Fotos: Viração Educomunicação

 

Muito se tem falado sobre a Reforma da Previdência, arquitetada pelo atual governo Temer, porém pensada desde o anterior. Mas você sabe o que é a Previdência Social e quais serão os efeitos dessa Reforma no Brasil?

Antes de mais nada, é de extrema importância saber que a previdência social é, além de um negócio que gera lucros e gastos, um direito social de todo cidadão brasileiro, garantido pela Constituição Brasileira em seu artigo 6º, “dos direitos sociais”, que inclui também educação, saúde e transporte.

No entanto, o governo atual brasileiro está propondo uma reforma na previdência social que afetará muitos trabalhadores e trabalhadoras, principalmente os mais jovens, que deverão trabalhar e contribuir para a previdência por mais tempo.

Diante de uma grande pressão e mobilização popular, a proposta original da reforma da previdência sofreu algumas alterações no mês de abril e seu novo texto altera, entre outros pontos, a idade mínima para se obter o benefício – as mulheres deverão ter 62 anos e os homens 65 para poder solicitar a aposentadoria. Atualmente, a idade mínima é 60 anos para mulheres e 65 para homens, e a proposta original alterava a idade de ambos os gêneros para 65 anos.

Outra alteração no texto é a questão do tempo de contribuição. Para obter o valor integral do benefício, mulheres e homens deverão contribuir por 40 anos – atualmente esse tempo é de 35 anos para homens e 30 anos para mulheres. Já o tempo mínimo para poder solicitar o benefício se mantém o mesmo que é hoje – 25 anos de contribuição tanto para homens, quanto para mulheres – com a diferença que o valor não seria integral.

 

Por que ser contra a reforma?

Com todas essas mudanças, muitas pessoas estão se colocando contrárias à reforma da previdência. Manifestações, paralisações e greves estão acontecendo no país, levantando essa bandeira.  

Diversos órgãos sociais já se posicionaram contra a reforma da previdência social que está em andamento no Congresso.  A Organização dos Advogados do Brasil (OAB), o Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o Conselho Federal de Economia (Cofecon), e centrais sindicais como a Central Única dos Trabalhadores, o Sindicato dos Metalúrgicos, dos Metroviários, Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil, entre outros, divulgaram repúdio ao projeto.

Mulheres lutando contra a Reforma da Previdência em manifestação feminista

Dentre os argumentos contrários à Reforma, estão a desconsideração da dupla jornada feminina, o excesso de tempo de contribuição e a falta de perspectiva de aposentadoria para os mais jovens.

O primeiro argumento contra a reforma é de que a sociedade machista na qual vivemos, não leva em conta a dupla jornada vivida por muitas mulheres no Brasil. Ainda existem pessoas que acham que as responsabilidades domésticas são deveres somente do gênero feminino, ou seja, ainda pensam que o serviço doméstico é de mulher e que o homem não deve fazê-lo. Assim, a mulher no Brasil exerce tanto o trabalho de casa, quanto o de fora, estando inserida no mercado de trabalho – e ainda recebendo menos que os homens na mesma função.

O segundo argumento, contraria a necessidade do cidadão de contribuir por 40 anos para acessar o benefício completo, o que significa que um jovem de 25 anos precisará trabalhar ininterruptamente até os 65, ou se tiver 30 anos precisará trabalhar até os 70 anos, em regime de CLT, para conseguir se aposentar recebendo o valor integral.

Essa situação piora no contexto atual, devido à reforma trabalhista proposta também por esse governo e aprovada pela Câmara dos deputados. Esse projeto deve tornar mais difícil a contratação celetizada (que segue a Consolidação das Leis do Trabalho, CLT) de trabalhadores, pois torna mais brandas as restrições a terceirizações e possíveis demissões em massa, além de menores salários em caso de novas contratações.

Um dos grupos mais prejudicados com a reforma é o das juventudes. O jovem Matheus Emílio, 21, estudante de direito, considera negativos os possíveis efeitos da proposta, principalmente no que tange a o aumento da idade mínima de aposentadoria. Esta elevação da idade mínima é embasada em dados do IBGE de que a expectativa de vida dos brasileiros aumentou. Todavia, não é feito um recorte social para medir este número, basta o próprio senso comum para sabermos que a expectativa de vida dos mais pobres não é a mesma dos mais ricos”, afirma.

Matheus também questiona a qualidade de vida dos mais jovens, em um contexto de flexibilização e precarização do trabalho. “Nós jovens, que estamos nos inserindo agora no mercado de trabalho, além de termos que enfrentar os retrocessos com a terceirização que já foi aprovada, teremos ainda que passar por isso por um maior período. E onde fica a qualidade de vida neste contexto?”

Além disso, outra crítica à Reforma da Previdência é quais camadas da população ela realmente contempla. Políticos e militares, por exemplo, não terão os requisitos alterados para ter acesso aos benefícios da previdência.

 

Afinal, a reforma é necessária?

Assim, o questionamento vai além: até que ponto essa reforma é realmente necessária?

O governo Temer argumenta que é preciso alterar a previdência, pois atualmente o fundo tem um rombo de 149,7 bilhões de reais, em 2016, e porque a tendência é que a arrecadação diminua com o envelhecimento da população.

Porém, críticos do projeto se contrapõem a esse argumento. Em carta aberta, a OAB, a CNBB, e a Confecon afirmaram que “A PEC 287/2016 tem sido apresentada pelo governo sob discurso de catástrofe financeira e ‘déficit’, que não existem (…) A Previdência no sistema de Seguridade Social, juntamente com as áreas da Saúde e Assistência Social, sistema que tem sido, ao longo dos anos, altamente superavitário em dezenas de bilhões de reais.”

O jovem Matheus também não legitima esse argumento. O governo afirma, categoricamente, que existe um ‘rombo na previdência‘, mas nunca apresentou de fato dados que o comprovem, e me questiono também o porquê, mais uma vez o governo opta em mexer nos direitos dos mais pobres e poupa os que detém o maior poder econômico. Por que eles não estão votando, por exemplo, uma lei para regulamentar a taxação das grandes fortunas, que já é prevista na Constituição de 1988, mas nunca foi colocado em prática? Será que retirar os direitos previdenciários, é mesmo uma prioridade para os cidadãos?” questiona.

Manifestação contra Reforma no dia 15 de março de 2017

 

Para entender o pacote de reformas proposta pelo governo Temer, a AJN conversou com Márcia Moussallem, Mestre e Doutora em Serviço Social, Políticas Sociais e Movimentos Sociais.

 

AJN: Dentro de todo esse debate que está ocorrendo sobre o tema e para elucidar a questão, o que é a reforma da previdência?

Márcia Moussallem : A reforma é uma das maiores atrocidades e retrocessos na história do Brasil do ponto de vista constitucional, do ponto de vista das garantias dos direitos que nós conquistamos durante anos. É uma atrocidade para o trabalhador que será o principal afetado, tanto o urbano como o rural, mulheres e homens; essa é uma das maiores atrocidades que está ocorrendo hoje nas propostas do atual governo, o governo Temer.

Não só isso, mas a reforma da previdência está lado a lado, é um conjunto, da reforma trabalhista e da PEC 55; é um conjunto amplo  e integrado do descaso dos direitos sociais que vai desde rasgar a CLT até a questão do tempo de contribuição, do tempo para se aposentar (de homens e mulheres) e isso é terrível para o Brasil porque rasga a constituição, rasga a CLT, a PEC 55 (que é o congelamento dos gastos públicos por mais de 20 anos)  está atrelada, também, à previdência.

Então essa totalidade desse conjunto da reforma da previdência, reforma trabalhista e PEC 55 são propostas de políticas de um governo neoliberal e que causa descaso na saúde, na educação, e na assistência social e que quebra por completo o tripé da seguridade social que foi um ganho a partir da constituição de 1988 que é saúde, educação e previdência social. A quebra tripé desse significa um abismo, um caos, e inclusive é inconstitucional! Todas essas propostas vão contra o ponto de vista legal e os juristas têm discutido o porquê é ilegal e que não deveria em hipótese alguma ir para frente, inclusive ter algum tipo de votação.

 

AJN: Sobre os pontos da reforma onde se igualam os trabalhadores e trabalhadoras, até que ponto é, e se é, necessário fazer esse tipo de modificação?

Márcia Moussallem: O mais interessante, que ninguém se dá conta, é que a constituição foi tão importante porque ela faz as diferenciações dos trabalhadores do meio rural, urbano, entre mulheres e homens. já a reforma da previdência nivela os homens, as mulheres, o campo e a cidade; e a reforma faz um nivelamento e isso é a maior atrocidade porque até então o trabalhador rural se aposentar no mesmo tempo de serviço que o trabalhador urbano, isso é um absurdo. Essa reforma não leva em consideração as diferenças. Eles não diferenciaram ninguém, mas nivelaram todos como iguais. A constituição faz essa diferenciação e essas reformas nivelam e tornam todos como iguais.

 

AJN: É possível perceber quais são os verdadeiros interesses com essas propostas e reformas que estão acontecendo?

Márcia Moussallem: A intenção é acabar definitivamente com a previdência social e valorizar a previdência privada, os interesses de quem propôs a reforma, que é a cúpula do Michel Temer com seus deputados e PMDB, estão completamente atrelados ao empresariado, ou seja, a intenção é que cada um pague pela sua previdência.

 

AJN: De acordo com as sugestões do governo, a previdência privada é a melhor alternativa. O que você pensa sobre isso?

Márcia Moussallem: Os empresários são os maiores apoiadores da reforma da previdência, trabalhista e PEC 55; a Fiesp está vibrando com isso. Ganham na saúde, porque privatiza a saúde, na educação, a proposta do ministro da educação é a privatização das universidades federais, ganham na assistência social, etc., tudo isso porque o governo é um governo que representa esses interesses corporativos do grande empresariado, e o que é mais triste é a sociedade cair no conto do vigário ‘de que é necessário fazer a reforma’ e a perspectiva a curto prazo é o aumente do desemprego e a precariedade em todas as áreas.

É a melhor opção porque eles (o governo) não querem mexer com o empresariado, não querem mexer com a burguesia, querem botar a população para pagar o pato em benefício dos empresários.

Pesquisas feitas por estudiosos da universidade e outros teóricos, mostram que essa reforma não é a melhor opção, porque vai aumentar ainda mais a precariedade, a queda de salário, desemprego, queda na qualidade de vida, enfim, existem outras por exemplo a reforma tributária (taxação das grandes fortunas) a curto, médio e longo prazo é possível ter outras opções sem o trabalhador pagar o pato.

Entenda ‘pagar o pato’, diga-se de passagem, não é porque a previdência tem um rombo, não é isso, o problema que existe dentro da previdência é com as empresas; as grandes empresas não pagam impostos, tem uma lista com mais de 500 nomes de empresas que simplesmente não pagam impostos, sonegam os impostos e se essa arrecadação fosse para a previdência, assistência social, saúde e educação seria diferente; a questão é o interesse que o governo tem nesse assunto.

Previdência privada é solução num governo neoliberal que privatiza tudo, saúde, educação, ou seja, é a meritocracia (individualização cada vez maior, cada um por si, e ‘consigo tudo pelo meu esforço’); isso é a falta de responsabilidade do Estado; isso é o Estado mínimo. A previdência é uma garantia de cidadania, é constitucional.

Imagine um plano de previdência privada para um trabalhador que ganha um salário mínimo e ainda ter que pagar a aposentadoria do bolso dele isso é um descaso, é o estado mínimo; vários países estão revendo essa questão da presença de um estado mais forte e o Brasil está no caminho de se tornar um Estado fraco.

 

AJN: Muito se fala em ‘rombo na previdência’ e que ‘as contas não fecham’, mas existe alguma prova ou dados oficiais que comprovem esse déficit?

Márcia Moussallem: Eles trazem esse mito, que diversos teóricos já mostraram que é falso, do rombo da previdência, esse mito que está sendo divulgado na grande mídia ‘o rombo na previdência’ e que é necessário fazer essa reforma se não as pessoas não irão se aposentar que dessa forma vai quebrar, é mentira; isso é uma forma violenta de assustar a população, essa forma de mostrar esse fantasma, isso é um absurdo porque já foi provado. Inclusive o Senador Paulo Paim (PT) propôs para as federações de abrir uma CPI para investigar as contas da previdência; então vemos que a sociedade está se articulando para provar que esse rombo é uma mentira.

Essa reforma está cheia de ilegalidades, com justificativas completamente ridículas e o mecanismo que eu vejo, como solução, é a articulação com a sociedade civil e com os movimentos sociais e com juristas, pois se isso (reforma) for aprovada nós vamos estar em um caos tremendo e para reverter isso, não sei se é possível com esse congresso que está aí e com o que vem em 2018.

Militante do movimento LGBT e de HIV/ AIDS, em São Paulo, Moises tem 20 anos, integra coletivos de juventude e HIV, e faz parte do projeto Viva Melhor Sabendo Jovem com foco em juventude, sexualidade e gênero, HIV e prevenção.

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