Crise climática e crianças
Discurso de Amanda Costa em almoço na Assembleia Geral das Nações Unidas, promovido pela TheirWorld
A convite do TheirWorld @theirworldorg, a jovem ativista climática e colunista da AJN, Amanda Costa, participou de um almoço da Assembleia Geral das Nações Unidas @unitednations sobre investimentos para a primeira infância. Em seu discurso durante o evento, a jovem destaca a importância de compreender as crianças como as mais afetadas pela emergência climática, faz uma interseção entre direitos da infância e a crise climática, propõe políticas verdes para um começo de vida melhor. Além disso, Amanda cita também o Comentário Geral Nº 26 do UNICEF, um documento que orienta governos, empresas e sociedade civil a proteger os direitos das crianças em um ambiente saudável e sustentável. Leia o discurso na íntegra.
Por Amanda Costa
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Bom dia a todos, todas e todes. Meu nome é Amanda Costa, sou jovem conselheira do Pacto Global da ONU no Brasil, membro do Vozes Negras pelo Clima e recebi a importante missão de trazer percepções sobre mudanças climáticas e primeira infância.
De acordo com o último relatório da UNICEF – índice de risco climático nas crianças, as crianças representam ⅓ da população global e são as mais afetadas pelas consequências da emergência climática. Desse modo, por que elas não estão no centro das notícias, discussões e políticas públicas relacionadas a esta crise?
Hoje também é o lançamento do Comentário Geral Nº 26, que trata sobre os Direitos da Criança e o Meio Ambiente, com foco especial nas Mudanças Climáticas. Ao organizar diretrizes e fazer recomendações, os comentários gerais orientam governos, empresas, sociedade civil e o sistema jurídico para atuar na proteção dos direitos das crianças e adolescentes, oferecendo caminhos para garantir que as crianças vivam em um mundo limpo, verde, saudável e realmente sustentável.
Deste modo, quero destacar três propostas essenciais que a comunidade brasileira apresentou para fortalecer esse documento que será de extrema importância para a construção, desenvolvimento e reflexão sobre o nosso diálogo:
- Combater o racismo ambiental e promoção da justiça climática: as crianças e adolescentes do Sul Global são as mais afetadas pela crise socioambiental e climática provocada pelas ações e omissões de países desenvolvidos e grandes empresas.
- Garantir o acesso à natureza, à segurança alimentar e a água potável para todas as infâncias: todas as crianças devem ter direito a áreas verdes, especialmente em centros urbanos. O direito das crianças à segurança alimentar e a água potável sofre grandes ameaças com as mudanças climáticas, já que elas impactam a agricultura e o abastecimento hídrico.
- Cuidado prioritário com crianças indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais: Essas crianças fazem parte do grupo mais afetado pelo desmatamento, queimada, garimpo ilegal, contaminação com mercúrio, mineração ilegal, poluição do ar e violações de direitos territoriais.
Vimos que os desafios são grandes, porém acredito que o poder de articulação, mobilização e financiamento presente nesta sala é ainda maior. É necessário um esforço local, nacional e internacional para criar mecanismos de participação e investimento para que crianças, principalmente as pertencentes a grupos vulnerabilizados, não tenham suas infâncias prejudicadas.
Infelizmente nos dias de hoje, ainda muitas instituições não querem trazer a intersecção de clima para as suas agendas porque acreditam que precisam primeiro garantir os direitos básicos da primeira infância. Mas quero que lembrem de algo: combater a crise climática também é uma forma para garantir os serviços básicos!
Pensar em segurança climática é pensar em como podemos desenvolver cidades, campos e comunidades sustentáveis para as presentes e futuras gerações, trazendo transporte de qualidade, água limpa e saneamento básico, moradia adequada, ambientes ecológicos devidamente equilibrados, acesso ao sistema de saúde, ampliação dos espaços de lazer e cultura e promoção da educação ambiental nas escolas, clubes e demais espaços formativos.
Ontem, na abertura da Assembleia Geral da ONU, o presidente Lula trouxe em seu discurso que as crianças serão as principais impactadas pelas mudanças climáticas e pelas desigualdades. O presidente do Brasil, que logo assumirá a presidência do G20, se comprometeu a não medir esforços para acabar com as desigualdades do nosso planeta, combater a crise climática e promover um desenvolvimento sustentável.
Mas agora eu pergunto: vocês também estão comprometidos com essa missão?
Precisamos acelerar políticas verdes para que o começo da vida seja o melhor possível. As crianças desejam viver o “futuro verde” no presente! Para isso, é necessário:
- Aumentar os investimentos em mitigação, adaptação climática e resiliência de serviços-chave para crianças, especialmente as que habitam em países do sul global.
- Promover uma educação climática e ecológica vinculada às culturas e identidades locais das múltiplas infâncias, através das Escolas baseadas na Natureza.
- Fortalecer os projetos criados por e para jovens: não basta bater palmas e dizer que apoia as juventudes. É necessário fortalecer o desenvolvimento institucional, ampliar a transferência de recursos e tecnologias e fomentar os projetos que são realizados na ponta por organizações de base.
O Instituto Perifa Sustentável está desenvolvendo o “Clima de Quebrada”, um projeto de formação racial e climática numa escola pública de São Paulo. Nós decidimos ser parte da solução, mas precisamos de apoio, recursos e investimentos para catalisar o nosso trabalho.
O ponto é: as mudanças climáticas já não são mais chamadas de mudanças climáticas. Agora falamos de crise, emergência e urgência climática. Mas essa inquietude não pode ficar apenas no discurso. A partir de hoje, o que vocês estão dispostos a fazer na prática? Qual será o compromisso de vocês com as crianças negras, indígenas e pertencentes a grupos vulnerabilizados?
Obrigada!
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