Conanda irá trabalhar para garantir participação das crianças na próxima conferência DCA

Durante entrevista coletiva concedida aos adolescentes educomunicadores da 9ª Conferência Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, que aconteceu em julho em Brasília (DF), Miriam dos Santos, presidenta do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), disse que todos os conselheiros irão trabalhar para tentar garantir a participação de crianças, representantes de todos os Estados, já na próxima conferência nacional.

“A gente vai se preparar para receber essas crianças, pensar em como pode ser essa participação e em toda uma estrutura para isso, assim como cuidamos para receber os adolescentes na conferência deste ano”, adiantou Miriam para os adolescentes educomunicadores.

Em uma das plenárias, um grupo formado por meninas e meninos entregou ao Conanda um documento solicitando maior participação das crianças nos processos das conferências. Neste ano, pela primeira vez, o Conselho incluiu adolescentes na comissão de organização do evento.

Carmem Oliveira, vice-presidenta do conselho, que também foi sabatinada pela galera, lembrou que as crianças já participam da etapa nacional, embora não sejam de todo o País. Citou a Cidade dos Direitos como um espaço de representação, já que muitas crianças que visitaram o local puderam deixar seus recados sobre a cidade ou o país que gostariam de ter. “Nos painéis, algumas das mensagens que as crianças colocaram estão até com mais consistência do que uma proposta elaborada por um adulto. E isso são formas dela participar”, comentou.

Na coletiva, as duas também explicaram o papel do Conanda junto aos conselhos tutelares estaduais e comentaram sobre a participação dos adolescentes no processo de organização da Conferência. Confira, abaixo, trechos da entrevista. A cobertura completa da 9ª ConfDCA pode ser conferida clicando aqui ou na reportagem especial da Revista Viração deste mês.

Amara Mariana (AL) – Qual o papel do Conanda e qual a relação com os conselhos tutelares?

Miriam: O Conanda é o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente. Ele foi criado em 1991 junto com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), mas na Constituição Federal já havia um artigo que previa a criação dos conselhos deliberativos de políticas publicas. Ou seja, o Conanda é o conselho que delibera políticas públicas e faz o controle social. Deliberar é algo como “resolver” questões ligadas aos direitos da infância e adolescência no País. Já o controle social é a fiscalização dessas políticas, de educação, saúde, profissionalização, esporte, lazer, cultura, e que são destinadas a vocês, se estão sendo eficientes e eficazes. Além disso, o Conanda é um conselho com formação mista, com representantes indicados pelo governo federal e pela sociedade civil. Nós temos 28 conselheiros, 14 representando a sociedade civil e 14 representando o governo. Eu faço parte do Conanda representando a sociedade civil, por meio da Rede  dos Salesianos. A Carmen é representante do governo, da Secretaria dos Direitos Humanos. Então nós temos mais 13 entidades da sociedade civil de âmbito nacional e mais 13 ministérios e órgãos de secretarias de nível federal do governo. E temos os nossos espelhos, vamos dizer assim, que são os conselhos estaduais. Então cada Estado da federação tem o seu conselho estadual e municipal.

O Conanda delibera as políticas públicas e o conselho tutelar requisita esses serviços de políticas públicas. O Conanda também financia ações de formação para esses conselheiros tutelares, porque eles têm o papel fundamental, e importante, que é trabalhar a questão da violação de direito, pois são acionados quando isso acontece, e buscam soluções dessa violação nos programas e nos serviços públicos de saúde, de trabalho, de educação, assistência social. São dois conselhos que têm trabalhado muito junto. Um deliberando e o outro requisitando os serviços.

Carmen: O Estatuto (ECA), ao trazer esse desenho dos conselhos de direitos e de conselhos tutelares, foi muito inovador, não só em relação ao que a gente tinha antes no Brasil, antes de 1990, quando surge o ECA, mas também inovador em relação a outros países. A gente tem um fórum de debate dos gestores nacionais de outros países e, por exemplo, o Equador tem um conselho nacional, uma espécie de Conanda, mas eles não são deliberativos. O Paraguai tem a mesma experiência, mas não é paritário (formação mista entre governo e sociedade civil). Então, um conselho que seja paritário e deliberativo é muito raro no mundo. E, com certeza, nós somos o único país do mundo que tem essa figura chamada conselho tutelar e ele traz uma série de inovações que dificultam que os outros países copiem essa ideia. Por exemplo, que ele é escolhido pela própria comunidade, pois geralmente são funcionários de governo, onde a comunidade não participa dessa escolha e, portanto, são cargos vitalícios, diferente do conselho tutelar, que é escolhido por um período determinado. Ele é um agente de proteção mais dentro da comunidade. Sabe a quantidade de conselheiros tutelares que temos espalhados pelo País? Cerca de 33 mil. Um batalhão de gente.

Pedro Henrique (BA) – Na Conferência Nacional não tem delegados crianças, apenas adolescentes. O que pensa sobre isso e como podemos resolver?

Miriam: Antes a gente tinha as conferências lúdicas (até 2005, todas as conferências dos adolescentes eram chamadas de conferências lúdicas), que eram paralelas as dos adultos. Quando aconteceu a conferência de 2005, os adolescentes fizeram uma moção dizendo que eles gostariam de participar da mesma forma que os adultos, fazendo as mesmas discussões. Então, na conferência de 2009, os adolescentes participaram das etapas municipais, estaduais e nacional como delegados, fazendo as discussões da mesma forma que os adultos, com o mesmo direito à voz e voto. Ao final dessa conferência de 2009, os adolescentes fizeram outra solicitação, que era a de participar de todo o processo de organização, desde o planejamento da comissão organizadora até a execução e operacionalização da conferência. E ainda agrupamos mais: a educomunicação. É tudo um processo. A gente se preparou para receber vocês, adolescentes, em toda a programação e planejamento da conferência. Foi uma coisa de cada vez.  E o que aconteceu? Chegou o pleito de participação das crianças. Então a partir de agora, a gente vai se preparar para receber essas crianças, pensar como pode ser essa participação e em toda uma estrutura para isso, assim como cuidamos para receber os adolescentes na conferência deste ano.

Carmen: É bom lembrar que as crianças já vêm participando da etapa nacional, embora elas não sejam crianças de todo o País. Em 2009 e agora a gente montou a Cidade dos Direitos, na qual as escolas fizeram visitações, e consideramos aquele espaço participativo, pois as crianças disseram que cidade e país elas queriam ter. Nos painéis, algumas das mensagens que as crianças colocaram estão até com mais consistência do que uma proposta elaborada por um adulto. E essas são formas dela participar. A gente não pode querer também trazer uma criança para a conferência e querer que ela fique como a gente, tendo de ficar quatro dias inteiros, horas e horas numa sala trabalhando. Precisamos ver quais linguagens podem ser usadas com elas, de quais formas pode ser essa participação, senão corremos o risco de ter “mini-adultos”, que reproduzem no microfone palavras de gente grande.

Kaíque da Silva Alcântara (GO) – Qual a importância da presença dos adolescentes na conferência? É pensanda alguma forma de ampliar essa participação?

Carmem: Eu não acho que a qualidade de uma conferência seja dada pela quantidade de pessoas. E nós estamos sentindo isso muito concretamente, pois estamos chegando quase no limite da nossa capacidade organizativa em termo de qualidade. Esse centro de convenções (Ulysses Guimarães), por exemplo, não comporta mais do que esse número (cerca de 2.500 participantes) de pessoas circulando, comendo, entrando em fila e tudo mais. Precisamos qualificar o processo lá na ponta. Um antigo militante, falecido há poucos meses, Antonio Carlos da Costa, dizia que as conferências não podem ser vistas como forma de pirâmide, ou seja, há um ápice que vai bater em Brasília como se fosse a etapa mais importante.  Então ele reforçava que a base da pirâmide é o momento mais importante, que é a etapa municipal, porque é ali que vocês moram, que está a família de vocês, e ali que vocês frequentam a unidade de saúde. Ou seja, o governo federal e estadual têm que dar apenas retaguarda para que as coisas aconteçam no município. Tem que inverter um pouco essa lógica e valorizar a discussão local. E no meu ponto de vista, quanto mais livre for a conferência melhor, porque daí não fica aquela disputa para ver quem será delegado e ganhará lugar na etapa nacional. Quando a conferência é livre, estamos ali no mesmo patamar. Então, tanto faz se eu sou adulto, adolescente, se o outro é juiz ou conselheiro tutelar.

Webert da Cruz (DF) – Por que a linguagem das conferências são muito técnicas? Elas dificultam a participação da criança e do adolescente.  O Conanda tem feito algum trabalho para tentar mudar isso?

Nós temos um eixo especifico dentro do plano decenal que diz respeito ao protagonismo e a participação das crianças e adolescentes. Então existem várias formas de participação e não podemos ficar presos só a conferência. Temos esse desafio de aproximar essa linguagem com a do jovem. E eu digo que isso é uma obrigação do adulto, de compreender mais os jovens do que os jovens nos compreender, pois temos mais experiências e vivências. Mas para isso, precisamos aprender a dialogar com vocês, com o mundo adolescente. É claro que tem gente que fala difícil porque não quer ser compreendido mesmo. Não quer socializar nem dividir conhecimento. Lógico que não temos a “receita do bolo”, mas estamos dispostos a descobrir esse caminho. Quem participou de conferências passadas, creio que percebeu uma evolução na forma de dialogar com crianças e adolescentes.

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1 Comment

  • É de extrema importância a participação de crianças e adolescentes em eventos como essa.
    Mas ñ podemos esquecer de garantir a participação “efetiva” dos mesmos, se o evento for direcionado para crianças e adolescentes será um sucesso!!

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