Clima: podemos esperar algo de Paris?

Paulo Lima e Roberto Barbiero*

Um verdadeiro compromisso com a história. Essa é a expectativa em relação à Conferência das Nações Unidas sobre o Clima, a COP21, a ser realizada em Paris de 30 de novembro a 11 de dezembro. É prevista a participação de 50 mil pessoas e 25 mil delegados oficiais, representando 196 países. Já foi confirmada a presença de 117 líderes mundiais, desde o norte-americano Barack Obama e do chinês Xi Jinping até a brasileira Dilma Rousseff e o indiano Narendra Modi.
Uma demonstração de que as mudanças climáticas são hoje o desafio científico, econômico, político e moral mais importante que a humanidade enfrenta. E Paris pode representar um ponto de virada neste desafio, dada a necessidade urgente de abordar os impactos que já estão se manifestando, com graves consequências especialmente nos países mais vulneráveis em termos sociais e econômicos.
Embora o clima da Terra tenha sofrido várias alterações durante sua história, o que torna inédita a fase que estamos enfrentando é a velocidade com que o planeta está se aquecendo e a contribuição feita pelo homem, que não tem precedentes na história.
As atividades humanas tiveram, de fato, um papel cada vez mais importante com o início da era industrial e o aumento progressivo da população mundial, contribuindo para o aumento acentuado das concentrações globais de gases de efeito estufa, especialmente dióxido de carbono, metano e óxido nitroso. Os altos índices de dióxido de carbono são devidos, principalmente, ao uso de combustíveis fósseis e aos efeitos do desmatamento, enquanto os de metano e óxido nitroso são devidos principalmente à agricultura, pecuária e à mudança no uso da terra. Além das áreas já conhecidamente responsáveis pelas principais emissões de gases de efeito estufa, como a produção de energia, transportes, construção e indústria, contribuem sempre mais, entre as atividades antrópicas responsáveis pela mudança climática, a incidência do desmatamento, a cadeia de produção de alimentos e a transformação dos solos.
O mundo científico, reunido em torno da respeitável voz do IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas), há muito levantou um sinal de alerta que indica a necessidade de reduzir significativamente as emissões de gases de efeito estufa, a fim de evitar que o aumento das temperaturas médias da Terra chegue aos +2°C em relação aos níveis pré-industriais (o que significa pouco mais de 1°C em relação aos dias de hoje), já que este limite representa o nível em que os principais impactos entrariam em uma fase de alto risco, por extensão e intensidade, e algumas mudanças no padrão de circulação oceânica e atmosférica poderiam se tornar irreversíveis.

Um novo acordo é possível?

A importância da COP21 se deve ao fato de que Paris deverá aprovar um novo acordo climático global e vinculativo para todos os países da comunidade internacional, incluindo desde os países industrializados (como os Estados Unidos e a União Europeia) e mais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa na atmosfera, até os países emergentes ou em desenvolvimento (como Brasil, China e Índia), que aumentaram consideravelmente as suas emissões nos últimos anos.
O grande número de chefes de Estado confirmados reflete, em parte, o otimismo em torno do alcance de um acordo sobre o clima em Paris, que tem seus fundamentos em um rascunho já tornado público. O trabalho é ainda longo porque, tal como está, o projeto de texto do acordo tem 55 páginas e cerca de 1.800 questões críticas sobre as quais os participantes da Conferência terão de concordar. O ponto sobre a redução das emissões de gases de efeito estufa, por exemplo, apresenta 16 opções diferentes. O financiamento da luta contra as alterações climáticas e o mecanismo de transparência são ainda outras questões sérias a resolver. É um texto que, graças a uma forte pressão de todos os setores da sociedade civil, viu no entanto o reinserimento, em comparação com a primeira versão, de um parágrafo substancial relativo aos direitos humanos e a princípios como equidade intergeracional, direitos das comunidades indígenas, igualdade de gênero e às necessidades de migrantes e populações em situação de vulnerabilidade.
A secretária-executiva da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança Climática, Christiana Figueres, tem repetido várias vezes não ter dúvidas de que Paris chegará a um acordo; sua única preocupação é que este acordo seja forte o suficiente para colocar o mundo no caminho de atingir o objetivo de limitar o aquecimento global a menos de 2 graus neste século.

Por enquanto, somente boas intenções
Um ponto de partida de grande importância é o fato de que todos os países foram convidados a apresentar os seus planos de contribuição voluntária para a luta contra as alterações climáticas em suas várias expressões (mitigação, adaptação, intercâmbio tecnológico, finanças), chamados Contribuições Nacionalmente Determinadas Pretendidas (INDCs).
Nada menos que 147 países apresentaram seus compromissos de redução, representando um total de aproximadamente 86% das emissões globais de gases de efeito estufa em 2010, ultrapassando as expectativas iniciais e mostrando, de forma inequívoca, o grande interesse na Conferência de Paris. A maioria desses compromissos preveem igualmente mecanismos de adaptação, reforçando assim a necessidade de, nos compromissos globais, dar às medidas de adaptação um papel igualmente importante ao da mitigação. Não menos importante é a entrada em campo dos EUA e sobretudo da China, entre os jogadores ativos e não passivos, em um jogo que, obviamente, assumiu um peso determinante também para estes gigantes da economia mundial.
De qualquer forma, o desafio ainda é amplo considerando-se que, para muitos observadores, embora seja um bom projeto, a proposta atual expressa medidas que poderiam não ser suficientes para manter o aquecimento abaixo de 2°C.
Isso deixa em aberto a questão de como monitorar as emissões e como assegurar a transparência e o acesso aos dados de cada país. A União Europeia introduziu, por exemplo, mecanismos obrigatórios para seus países membros a fim de atingir os próprios objetivos de redução; mas poderiam estas obrigações ser estendidas, com as eventuais sanções relacionadas, a todos os países que aderiram ao acordo? E por último, mas não menos importante, permanece aberta a discussão sobre os recursos financeiros a serem direcionados e o apoio necessário aos países em desenvolvimento, que têm menos responsabilidade pelas emissões no passado e que, em muitos casos, sofrerão os maiores impactos das mudanças climáticas.

Participação da sociedade civil

Em meio a tudo isso, não pode ficar em segundo plano a ameaça de terrorismo e dos ataques que atingiram recentemente a cidade de Paris, entrelaçando-se aos eventos igualmente trágicos ocorridos em Beirute e Bamako.
Apesar do clima de ameaça de novos ataques na Europa, acreditamos que a COP21 não deve ser realizada a portas fechadas, blindada, sem a participação direta da sociedade civil nas muitas manifestações populares planejadas em Paris, como a Marcha pelo Clima de 29 de novembro e a Conferência Internacional da Juventude sobre o Clima, COY11, que reunirá centenas de jovens de todo o mundo.
A tentação é de responder aos eventos de violência fechando os espaços de participação e de democracia que, ao invés disso, precisam ter reação oposta – pois o mundo que defendemos é de paz, de luta contra as desigualdades e pela justiça climática. É com esse espírito que irá a Paris, para acompanhar e informar sobre a COP 21, uma delegação de jovens e pesquisadores da Agência Jovem de Notícias, um projeto promovido pela Viração Educomunicação em parceria com a Red+Vos, Fundación Tierravida, Fundação Friedrich Ebert, Rede de Adolescentes e Jovens Comunicadoras e Comunicadores, Engajamundo, Coletivo Clímax Brasil, Monde Pluriel, Província Autônoma de Trento, Associazione In Medias Res e Osservatorio Trentino sul Clima.

* Paulo Lima é fundador e diretor da Viração educomunicação e coordena o projeto internacional Agência Jovem de Notícias em Paris, com a participação de 30 jovens de 12 países.
Roberto Barbiero é físico climatologista e fará parte da delegação trentina para a COP21.

(Tradução: Juliana Winkel, jornalista da Agência Jovem de Notícias)

Jornalista, professor e educomunicador. Responsável pelos conteúdos da Agência Jovem de Notícias e Revista Viração.

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