A reunião de Lula com governadores e o escancaramento da falta de mulheres na política

Após os ataques ocorridos em Brasília aos prédios do Congresso Nacional, do Palácio do Planalto e do Supremo Tribunal Federal (STF), Lula se reuniu com representantes dos três poderes e com todos os 27 governadores do Brasil. O ato foi amplamente comentado pela imprensa, mas pouco se falou da representação feminina na reunião, que escancarou disparidades de gênero há muito tempo presentes na política brasileira.

Por Sofia Leite

No último domingo, 8 de janeiro, golpistas vindos de todas as partes do Brasil, para pedir a deposição do chefe do Executivo, invadiram os prédios dos três poderes, em Brasília, e depredaram tudo que encontraram pela frente. O acontecimento foi amplamente comentado pela mídia e gerou inúmeros desdobramentos, como uma reunião entre Lula (PT), atual Presidente da República, e os 27 governadores do Brasil. Esse ato simbólico, quase inédito na história brasileira, teve a intenção de mostrar para a população e, principalmente, para os terroristas responsáveis pela destruição, que a Democracia continua viva e que tamanha barbárie não atingiu seus objetivos golpistas.

Tanto a gravidade dos atos golpistas quanto a simbologia por trás da reunião foram muito debatidas. No entanto, algo que de certa forma ‘passou batido’ foi o escancaramento das disparidades de gênero. Essa problemática foi trazida à tona pelo episódio, aqui citado, que veio após os pedidos de golpe, porém há muito tempo está presente em nossa sociedade. Nessa reunião, vimos uma mesa composta por 24 governadores homens e apenas 3 mulheres.

Legenda: Mulheres ainda são minoria nos cargos mais altos do Poder Executivo. Foto: André Góis / Reprodução Fátima Bezerra – Twitter

As mulheres sempre foram vítimas de tentativas de afastá-las da política. Isso se torna extremamente notório quando lembramos que, no Brasil, elas só conquistaram o direito ao voto depois de muita luta do movimento sufragista, em 1932. Essa data é considerada muito tardia quando comparada à maioria dos países desenvolvidos. Na Nova Zelândia, por exemplo, essa conquista se deu no ano de 1893, quase 40 anos antes do Brasil, o que levou esse a ser o primeiro país a garantir o sufrágio feminino.

As três governadoras que estavam presentes na reunião, as únicas no país inteiro, são Fátima Bezerra (PT), do Rio Grande do Norte, Raquel Lyra (PSDB), de Pernambuco, e Celina Leão (PP), do Distrito Federal. É válido rememorar que a governadora do DF só assumiu o cargo após o afastamento de Ibaneis Rocha (MDB). Isso aconteceu devido a um decreto de Alexandre de Moraes, Ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), que entendeu que houve omissão por parte do então governador diante dos ataques terroristas, já que ele tinha conhecimento do que estava por vir em Brasília e não fez nada para impedir o caos.

Celina Leão / Fátima Bezerra / Raquel Lyra

Celina Leão, que foi eleita como vice de Ibaneis, representa uma realidade da política no Brasil. Na maioria das vezes, ser vice é o lugar mais alto em que a maior parte das mulheres consegue chegar dentro do Poder Executivo. Para confirmar isso, basta lembrar que, em toda a história brasileira, apenas uma mulher, Dilma Rousseff (PT), chegou à Presidência, mais importante cargo do Executivo. Como se não bastasse, Rousseff ainda sofreu um impeachment totalmente baseado em misoginia, o que interrompeu seu segundo mandato.

Em 2022, inclusive, o ato de colocar uma mulher no posto de candidata a vice foi uma estratégia adotada por inúmeros partidos para tentar mostrar que havia representatividade e para receber recursos dos financiamentos públicos de incentivo à inclusão feminina na política. Até mesmo os partidos de esquerda, para os quais as pautas feministas são tão caras, não levaram muitas mulheres aos cargos principais. Isso é algo que acontece porque esses grupos políticos ainda são dominados por homens com pensamentos e tradições machistas, os quais priorizam pessoas do gênero masculino para assumir as posições mais altas.

Legenda: Mulheres ainda são minoria nos cargos mais altos do Poder Executivo. Foto: André Góis / Reprodução Fátima Bezerra – Twitter

No Ceará, Izolda Cela, atualmente sem partido, foi eleita, em 2014 e em 2018, como vice-governadora na chapa em que Camilo Santana (PT) encabeçava. Após Santana se afastar do cargo, ao anunciar que se candidataria a senador, Cela, até então filiada ao PDT, assumiu como governadora, sendo a primeira vez na história do estado que uma mulher chegou a esse patamar. Essa mudança dava a ela o direito de concorrer, em 2022, à reeleição, mas seu partido da época decidiu que o candidato seria o ex-prefeito de Fortaleza Roberto Cláudio. Depois disso, Cela se desfiliou do PDT e, agora, é secretária-executiva do Ministério da Educação.

Esse ocorrido deixa bastante explícita a relutância dos partidos em colocar mulheres em posições de maior liderança. Diante disso, também devemos nos atentar, para além do Executivo, ao Legislativo. Foram eleitas apenas quatro mulheres senadoras e 91 deputadas federais nas últimas eleições, números bem menores que os referentes à quantidade de homens ocupando esses mesmos cargos. Tudo isso nos mostra que a luta feminina por uma real equidade dentro da política está longe de chegar ao fim. É preciso, então, que não abaixemos a cabeça e que sigamos nos impondo diante da dominação masculina.

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