A potência da participação cidadã: jovens negros periféricos na Câmara Municipal

O Encontro de Juventudes, iniciativa da Rede Multiatores MUDE com Elas, ocupou a CMSP  com aula sobre orçamento público e suas distribuições, discussão sobre políticas públicas e muita arte.

Por Camila Alves e Rhafaela Resende, da Viração Educomunicação.

No último sábado de Junho (24), a Câmara Municipal de São Paulo foi palco de um evento importante de mobilização: o ‘Encontro de Juventudes – Orçamento e Políticas Públicas’, organizado pela Rede Multiatores MUDE com Elas. Na ocasião, a Rede – composta por representantes de empresas e organizações como Ação Educativa, Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha (AHK São Paulo) e pelo escritório de Terre des hommes Alemanha em São Paulo (Tdh) – apresentou uma carta de proposições destacando as demandas e perspectivas da juventude para impulsionar as políticas públicas.

A partir da mobilização de organizações e cursinhos populares, mais de 100 pessoas ocuparam o Salão Nobre da Câmara, com um público majoritariamente jovem, negro e vindos de diferentes periferias, em um feito histórico num espaço público de debates e decisões políticas. Como representantes do campo político e da sociedade civil organizada, participaram as co-vereadoras Débora Dias, do Quilombo Periférico, e Natália Chaves, da Bancada Feminista, além de representantes do vereador Isac Félix e da vereadora Jussara Basso. 

A partir da fala de estudantes pré-vestibular que compunham a mesa, evidenciou-se que a atuação de iniciativas como os cursinhos populares vai muito além de oferecer possibilidades de estudo e de acesso à universidade; elas fortalecem a educação dentro nas periferias, que sofrem com a ausência de políticas públicas nesta área – apoiando, assim, os estudantes no entendimento de seu papel social e político. A presença destes estudantes em eventos como o Encontro de Juventudes deixa evidente o potencial de mobilização que têm e mostra que é possível esperar ação desses jovens organizados, além de garantir espaços de participação cidadã para que eles se expressem e tenham suas vozes, de fato, consideradas.

A programação contou com uma aula sobre ‘Orçamento público’, ministrada por Lauana Simplício, gestora pública e mestranda em Ciências Políticas pela USP. Além de explicar o conceito de orçamento público, a especialista contou como são definidas as estratégias de investimento financeiro a partir das políticas públicas e como o orçamento  está relacionado diretamente com a garantia de direitos dos cidadãos da cidade. A atividade formativa, realizada nesse ambiente de tomada de decisões, trouxe para a juventude presente o conhecimento técnico  necessário para que pudessem debater de forma ativa como o dinheiro público deveria ser utilizado para atender aos interesses reais da população.

O que é orçamento público?

Orçamento público é um mecanismo que permite ao governo planejar, controlar e distribuir os recursos financeiros dos cofres públicos – que são arrecadados, principalmente, com o pagamento de impostos pela sociedade – para retornar a aplicação desse dinheiro no atendimento às necessidades, demandas e prioridades da população de determinado território.

Além de determinar como o governo vai gastar o dinheiro público, o orçamento  é implementado como um contrato social, no qual se estabelece um pacto com os representantes eleitos para que municípios, estados e a união devolvam o recurso arrecadado para a população em forma de políticas públicas – como oferta de educação de qualidade, políticas de cultura, políticas de esportes, investimento em transporte, coleta seletiva, entre outros.

As políticas públicas brasileiras estão presentes na sociedade em forma de ações e programas desenvolvidos através de um sistema de planejamento e orçamento com determinados períodos e separados em 3 leis orçamentárias: Plano Plurianual de Ações (PPA), determinado pelos governantes em um período de 4 anos; Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), onde são selecionadas as prioridades dos governantes para o ano atual do governo, e Lei Orçamentária Anual (LOA), onde está presente os detalhes de cada ação realizada no âmbito municipal, estadual e federal. E é sobre esse orçamento que a rede mobilizada pela iniciativa multiatores MUDE com ELAS vem buscando incidir.

Além de tratar dessa importante questão, o encontro contou com performances culturais, como o grupo de Capoeira – A Fúria do Negro, que conduziu uma vivência artística de Maculelê, uma dança afro indígena brasileira, convidando os jovens a se movimentarem em uma experiência rítmica com batidas ligadas aos cultos africanos, levando a arte e a cultura das periferias para o centro do debate; a talentosa Elix Rodrigues, que emocionou o público com uma apresentação musical poderosa e cheia de conexão, relatando a sua vivência como uma mulher trans e preta. Uma apresentação do Sarau Pikadilha encerrou o encontro representando as juventudes que, através dos diferentes tipos de expressões, denunciam as discriminações constantes que mulheres, negros e principalmente moradores das periferias sofrem diariamente.

Ainda falta representatividade de raça e gênero

Na CMSP, temos, ao todo, 55 vereadores representando a população. Porém, ao olhar mais de perto, percebemos que desse total, são apenas 12 mulheres e 11 pessoas que se autodeclaram pretas ou pardas – isso já é impactante o suficiente, sem considerarmos a faixa etária de todos os eleitos. Quem essas pessoas eleitas representa, senão um grupo populacional específico? Onde e como as juventudes brasileiras estão sendo representadas nos espaços institucionais de decisões políticas? 

Encontros como esse abrem espaço para a reflexão sobre a importância da participação ativa dos jovens negros e periféricos da cidade de São Paulo nos debates e na construção de políticas públicas que impactam suas vidas diretamente. Demonstra, também, o quão fundamental é prepará-los para que se tornem protagonistas no exercício de participação política e cidadã. Ao empoderar esses jovens, garantir que suas vozes sejam amplificadas e que a representatividade seja a regra, estamos fortalecendo a democracia.

Para alguns jovens, participar do evento foi importante por marcar sua primeira vez na CMSP, a chamada casa do povo, com a oportunidade de terem suas vozes ouvidas e unidas sobre um objetivo comum. As trocas de experiências, bem como as propostas apresentadas mostram que a juventude quer assumir o compromisso em criar, coletivamente, um futuro melhor!

Como saldo do Encontro das Juventudes na Câmara Municipal de São Paulo, fica a certeza de que há  muita disposição para lutar pela garantia de que as demandas por acesso ao trabalho digno, à educação de qualidade, à saúde e bem-estar sejam atendidas. É essencial que o poder legislativo esteja atento às questões das juventudes e trabalhe para que elas estejam amparadas pelo campo político, possam se desenvolver e participar da construção de uma sociedade mais diversa e pautada na dignidade.

Assista o encontro na íntegra:
Sobre a iniciativa Mude com Elas – Multiatores superando a desigualdade de gênero e raça

O Mude com elas é uma iniciativa implementada em parceria pela Ação Educativa, AHK São Paulo – Câmara de Comércio e Indústria Brasil-Alemanha em São Paulo e do escritório da Terres des Hommes Alemanha em São Paulo, com apoio da Viração Educomunicação, que atua como parceira na produção de conteúdo e na divulgação das atividades promovidas por meio da Agência Jovem de Notícias.

A iniciativa tem o objetivo de contribuir para o enfrentamento da desigualdade racial, econômica e de gênero que atravessa a inserção de jovens no mundo do trabalho através da criação de uma parceria envolvendo a sociedade civil, poder público e setor privado capaz de mapear cenários, e traçar estratégias que se desdobram em políticas públicas, iniciativas e implementação de boas práticas para melhorar as possibilidades de inserção de jovens mulheres negras no mundo do trabalho e oportunidades. 

LEIA A CARTA DA REDE MUDE COM ELAS PARA O DESENVOLVIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DIRIGIDAS À JUVENTUDE PAULISTANA

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