A abdução das mídias: para onde levaram a grande reportagem?

Por Safira Teodoro

“Se a reportagem morreu eu não sei, mas eu ainda vivo, e vivo disso” conta o repórter Ricardo Kotscho, com seus 54 anos de carreira, no Seminário Jornalismo, novas configurações do quarto poder, realizado pelo Sesc Vila Mariana e pela Revista Cult. Ao seu lado, os repórteres Leonencio Nossa e Carol Pires completam a mesa que se tornou, além de um debate sobre o lugar da reportagem no século 21, uma conversa recheada de causos sobre o dia a dia do jornalista.

Mesmo que não exista mais tempo nem dinheiro nas redações para realmente manter as grandes reportagens, Kotscho insiste que quando o jornalista quer fazer, ele faz. Claro, tem de querer mais do que um salário no fim do mês para durar na profissão de repórter, precisa ter vontade de contar histórias.

Leonencio ainda confessa que fazer livro reportagem não gera reconhecimento nenhum por parte do público, no máximo alguns amigos e familiares seus vão comentar no facebook: Parabéns, show! E isso na maioria das vezes também quer dizer que nem eles leram. Mas o premiado jornalista prefere se conformar com sua escolha: “Quem nasceu escorpião, nasceu escorpião, quem nasceu barata, nasceu barata. Se você acha que nasceu jornalista, o que resta é enfrentar essa crise sem medo de se dar mal, porque você vai se dar mal mesmo”, conta rindo.

Com as redações enxutas, muitos jornalistas enfrentam uma jornada dupla para bancar a “aventura da reportagem”. Recorrem ao jornalismo diário e, ao mesmo tempo, correm atrás de sua história. Construir este tipo de narrativa é um processo lento, são anos de apuração e dedicação até chegar ao resultado final. Mas o prazeroso para eles é exatamente isso: o processo, a vivência.

Ao longo da conversa, diversas histórias de reportagens foram relembradas pelos convidados, inclusive a primeira experiência de Kotscho com um gravador. Quando começou a fazer jornalismo, em 1964, o equipamento do repórter era um caderninho, mais nada. Até hoje, ele confia suas entrevistas ao papel ao invés dos eletrônicos. “Quem está na faculdade agora tem que saber tudo, eu não sei nada e já não tenho mais idade para aprender”, comenta.

TV, rádio, foto e escrita, todas essas mídias que foram introduzidas cada uma a seu tempo no universo do repórter, foram sugadas para o meio digital e hoje convergem na reportagem multimídia. Carol comenta que este gênero jornalístico é como um ornitorrinco, parece um pato, parece um castor, mas na realidade é outro bicho. Da mesma forma, esse tipo de comunicação se assemelha à muitas outras linguagens, mas ao mesmo tempo é único.

Tem quem pense que o futuro da grande reportagem seja essa convergência de mídias, ao proporcionar imersão, profundidade e ao mesmo tempo dinamismo para o conteúdo. Leonencio admira esse tipo de trabalho, mas vê que não é a mudança da linguagem que irá gerar mais clicks, os youtubers ainda estarão na frente em audiência.

A criação desta nova forma de se construir uma história também não quer dizer que as outras irão acabar. Ricardo Kotscho, Leonencio Nossa e Carol Pires são um exemplo de que a reportagem a moda antiga também funciona e é lida.   

Cobertura Educomunicativa

A Agência Jovem de Notícias realizou a cobertura educomunicativa do Seminário “Jornalismo: novas configurações do quarto poder”, realizado pelo Sesc Vila Mariana e a Revista Cult. A atividade é realizada em parceria entre a Viração e o Sesc Vila Mariana e conta com a participação de 13 jovens estudantes de jornalismo, com o apoio de profissionais da Viração.

 

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